Quadro a óleo do pintor anadiense Fausto Sampaio (1893-1956) representando um grupo de populares a regressar da Romaria da Ascensão ao Buçaco |
Aqui na Bairrada, a par de muitos outros concelhos desde Melgaço a Monchique, este Dia da Ascensão foi instituído como Feriado Municipal por três municípios - Anadia, Mealhada e Oliveira do Bairro - e ainda por outro limítrofe - Mortágua. Assim as respetivas populações podem participar na grande Romaria da Ascensão ao Buçaco, ou noutras mais pequenas como a do Vale da Bica, junto a Anadia, conhecida como o "Buçaquinho".
A romaria ao Buçaco começou depois da extinção das ordens religiosas (1834) e da abertura às populações da cerca do Buçaco, antes eremitério dos Carmelitas Descalços. As atenções passaram a focar-se nas celebrações religiosas e profanas de dia de festa, nos grandes farnéis transportados a pé, e talvez, com o tempo, se começasse a esquecer a apanha do ramo da espiga com o seu simbolismo pagão.
A romaria ao Buçaco começou depois da extinção das ordens religiosas (1834) e da abertura às populações da cerca do Buçaco, antes eremitério dos Carmelitas Descalços. As atenções passaram a focar-se nas celebrações religiosas e profanas de dia de festa, nos grandes farnéis transportados a pé, e talvez, com o tempo, se começasse a esquecer a apanha do ramo da espiga com o seu simbolismo pagão.
Não sendo natural da Bairrada, lembro-me de em miúda ir com a minha mãe ao campo apanhar o ramo da espiga - papoilas, malmequeres, espigas, ramo de oliveira, alecrim,... - e repeti mais tarde o ritual com os meus filhos, embora por aqui já não seja um costume muito seguido.
Este dia é nitidamente mais uma apropriação que o Cristianismo fez de rituais pagãos muito enraizados nos hábitos populares e diga-se que é uma tradição digna de ser preservada, pelo que representa de celebração da natureza e da atividade saudável ao ar livre.
O facto de o ramo ser guardado até ao ano seguinte, ficando de prevenção atrás da porta para, se necessário, se pôr um pouco dele a arder e assim apaziguar as forças da natureza, neste caso o deus dos raios e trovões, denota bem a origem pagã do ritual.
O facto de o ramo ser guardado até ao ano seguinte, ficando de prevenção atrás da porta para, se necessário, se pôr um pouco dele a arder e assim apaziguar as forças da natureza, neste caso o deus dos raios e trovões, denota bem a origem pagã do ritual.
A propósito do Dia da Espiga, lembrei-me de mostrar um formato de pratos que Sacavém produziu durante décadas, tendo espigas moldadas na aba.
Não sei se o primeiro prato deste conjunto de três, o motivo número 1203, terá sido o primeiro do formato Espiga com motivo central, mas a verdade é que neste coincide o relevo da aba com o desenho do centro, que também apresenta espigas. Será que a flor presente pretende representar uma papoila, vindo a inspiração do ramo da espiga?
O que eu sei é que estes pratos andaram ao uso em minha casa nos anos 50 e lembro-me de comer a sopa toda, incentivada pela promessa de ver uma "coisa linda" no fundo do prato... :)
As marcas que todos apresentam, segundo informação que li no MAFLS - Memórias e Arquivos da Fábrica de Loiça de Sacavém - a avaliar pelo formato da fivela no cinto, foram usadas num período que vai de cerca de 1930 até cerca de 1970.
Finalmente este exemplar marcado com o número 1202, deve ter feito a transição entre os modelos totalmente brancos e os que apresentam motivo central. Aqui as espigas da aba tornam-se mais visíveis, graças ao amarelo com uns toques acastanhados a destacar-se da cor verde.
Mais uma curiosidade: o diâmetro do prato branco de sopa (22cm) é inferior ao dos outros pratos (23,5cm), também de sopa.
¡Qué bonito!
ResponderEliminarNo conocía esa fiesta,me encantaría participar en ella
Un Abrazo
Olá Princesa,
EliminarEstou certa que em Espanha também há ou houve tradições relacionadas com o Dia da Ascensão, embora diferentes desta.
Em Portugal esta festa já perdeu a beleza e autenticidade do passado mas na minha região continua a realizar-se todos os anos.
Um abraço
Olá Maria Andrade
ResponderEliminarQue saudades que o seu post despertou em mim!!Fez-me recuar até aos meus primeiros anos de trabalho,quando estive colocada no concelho de Loures, na Apelação,na altura uma pequena terra que tinha ainda as habitações muito próximas dos campos, o que permitia ir com toda a catraiada apanhar as flores para o ramo.Era um dia de ar puro, com direito a lanche no meio dos campos floridos :) hoje, já não será assim.
Aqui, nesta região do norte, onde vivo, não há o hábito de se oferecer o ramo da espiga, o que é pena, pois é uma tradição muito bonita.
Os seus pratos são muito bonitos na sua singeleza e foram muito bem escolhidos, para o dia de hoje.O motivo central do primeiro prato,parece de facto ser uma papoila.
Também eu, pensei em fazer um post relacionado com o Dia da Espiga, mas como só tinha uma triste foto de uma papoila, desisti :)
Beijos
Olá Maria Paula,
EliminarAndo outra vez em fase de perder comentários, deve ser problema do blogger, este é o segundo que escrevo aqui.
Que bom que este post lhe suscitou memórias tão agradáveis!
Realmente quando se vive no campo é muito mais fácil manter estas tradições e eu ontem só não fui apanhar um raminho da espiga porque percebi que não encontraria papoilas por perto e acho que sem papoilas o ramo não teria graça :)
Inicialmente tinha planeado fazer o post com um prato Wedgwood decorado com espigas e papoilas, mas afinal lembrei-me das espigas de Sacavém , o que é muito mais adequado para assinalar uma tradição portuguesa.
Para a próxima, para comemorar este dia, a Maria Paula vai ao campo ou a um jardim aí de Braga apanhar um ramo da espiga e depois com a sua mestria fotografa-o...
Vai ficar um post bem bonito!
Beijos
Olá Maria Andrade
ResponderEliminarVivo e trabalho na grande cidade, e a tradição deste dia não é ir ao campo, mas sim procurar vendedores de espigas à porta das estações de comboio ou autocarros. Infelizmente é assim, no entanto, a tradição de ter uma espiga nova todos os anos mantém-se.
Quanto aos seus pratos devo dizer que gostei muito do último colorido. Esta fábrica de Sacavém tem motivos para todos os gostos e ocasiões.
Um beijinho
Ana Caetano
Olá Ana Caetano,
EliminarTem graça que eu lembrava-me de já ter visto à venda ramos de espiga e não sabia exatamente onde, mas estou agora convencida de que foi em Lisboa. À falta do contacto direto com o campo, sempre é um bocadinho de natureza que se leva para casa, ajudando a evocar este dia e esta tradição ancestral.
Quanto ao meu último prato de Sacavém, com uma aba bem bonita e pouco vista, veja lá que me ia esquecendo dele... :) por isso ficou para o fim...
Beijos
Olá Maria
ResponderEliminarÉ sempre bom recordar memórias tão agradáveis, como a do dia da espiga. Lembro-me, embora na cidade, de ir para os campos, que os havia, apanhar espigas, principalmente as papoilas.
Cumprimentos.
if
Olá if,
EliminarMuito obrigada pela visita e pelo comentário.
Ainda bem que este post lhe trouxe à memória as suas vivências desta tradição primaveril. Tempos em que as cidades não estavam de costas tão voltadas para o campo e as famílias procuravam usufruir mais dos ambientes campesinos...
Um abraço
Maria Andrade estes pratos com espiga, todos brancos marfim, da Sacavém, foram os pratos que encontrei na casa do Alentejo quando lá cheguei, deixados pelos anteriores donos; de todos os pratos deixados, e quase todos eles relativamente bonitos, de faiança, os de sopa eram deste modelo que aqui mostra, pelo que, durante muito tempo eram os que usava à hora da refeição, até ter a minha própria louça.
ResponderEliminarA juntar aos outros que já tinha, com o mesmo motivo, fiz um bonito conjunto de "espiga".
Este tipo de uso do dia da espiga é algo que não conhecia, pois na aldeia, para os seus lados, não me lembro de tal ser comemorado de uma forma muito entusiasta. Havia um ou outro que apanhava umas papoilas (mais pela cor e beleza da flor) que juntava a umas espigas, mas ... ficava tudo por aí.
Em Lisboa, havia professores que faziam questão de comemorar este dia, o que me admirava muito, pois em Moçambique nunca tal foi uso. Quiçá, se acaso fosse uma tradição britânica, talvez o tivesse sido, mas coisas que fizessem lembrar as aldeias e a vida pobre que, aí, as pessoas tinham levado, era algo para esconder a "sete chaves".
Não me recordo de ter comemorado devidamente este dia.
Manel
Que sorte, Manel, ter tido esse bónus dos pratos de faiança na compra da casa!
EliminarQuanto ao Dia da Espiga, em muitos locais já se deve ter perdido há muito o hábito de o celebrar.
Aqui na zona da Bairrada onde eu vivo, por exemplo, a maioria das pessoas não observam essa tradição e eu estou convencida que tal facto se deve a, desde meados do século XIX, celebrarem a Quinta-feira da Ascensão com outros rituais, neste caso com a Romaria da Ascensão ao Buçaco.
Na nossa zona há neste dia a Romaria da Senhora do Circo ou Circulo, uma das "irmãs" da Senhora da Estrela, mais perto de si. Sei que de lá traziam - não sei se ainda trazem - ramos de flores, sobretudo as cucas ou rosas-cucas, mas independentemente de se ir ou não à romaria(eu nunca lá fui levada...) apanhava-se de manhã o ramo da espiga.
Sendo uma tradição de ar livre e de flores, que até faz concorrência aos banhos de shopping e ao consumismo desenfreado, devia-se tentar manter, sobretudo junto das crianças.
Já pensei que para o ano já posso levar o meu neto...
Um abraço
Bem, eu fui criado num bairro incaracterístico de Lisboa onde não se comemorava nada, a não ser as vitórias do Benfica ou do Sporting no futebol e tudo o resto era aquela arquitectura dos anos 60 e 70 feia, banal e triste. Só quando fui viver para o centro de Lisboa, em 1989, descobri que na capital existiam procissões, tradições, festas populares como o enterro do entrudo, para não falar dos Santos populares, quando a marcha, antes de ir para a Avenida desfilava nas ruas do bairro.
ResponderEliminarTambém de lembrei de imediato dos pratos em casa do manel. Comiamamos neles quando andávamos a caiar a casa e tinhamos tanta fome que os pratos pareciam porcelana do Saxe, contendo bifes do lombo, lagostas e caviar.Lolol
Luís, já calculava que a esses bairros mais recentes de Lisboa, de gente 100% citadina, não chegassem ecos destas tradições populares das zonas rurais. Só se fosse a lavadeira saloia a trazer o ramo de espiga...
ResponderEliminarLembrei-me foi das suas raízes transmontanas, mas certamente só lá ia nas férias grandes, o que não coincidia com a data desta tradição, sempre em Maio. E não sei se é um costume muito enraizado em Trás-os-Montes.
Quanto às suas memórias dos pratos do Manel, é claro que trabalho duro nas obras exigia baixela a condizer, isto é, bela faiança de Sacavém... LOL