Houve um tempo, há cerca de dez, doze anos, em que a loiça da Fábrica de Alcântara exercia um certo fascínio sobre mim, mas sempre que via peças desse fabrico à venda, achava-as muito caras e lá ia resistindo. A certa altura comprei um prato rachado num antiquário da Figueira da Foz porque adorei o motivo decorativo, o motivo PAIZAGEM. A partir daí adquiri mais algumas peças, com um ou outro defeito, mas sem por isso perderem o encanto original. Achava muito interessante algumas das marcas terem escrito LOUÇA À INGLEZA a par do nome da fábrica. Era o reconhecimento inequívoco da influência da produção cerâmica britânica no fabrico nacional de faiança fina.
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Através da obra Marcas da Cerâmica Portuguesa, de José Queirós, da Livraria Estante Editora, 1987, tomei conhecimento de que a fábrica tinha sido fundada em Lisboa, em 1885, por dois sócios, Stringer e Silva, daí a primeira marca com os dois S das suas iniciais, mas logo no ano seguinte fora transferida para outras mãos, passando a usar as iniciais L & C de Lopes & Cª na nova marca.
Mais não sabia, e por isso, quando decidi fazer um post sobre estas faianças, não dispondo de bibliografia sobre o assunto, fui procurar informação nas páginas da internet.
Assim fui ter ao blogue A Fábrica de Louça de Alcântara: breves notas sobre a sua produção e foi lá que encontrei a informação disponível sobre a fábrica, resultado de um levantamento de peças, marcas e motivos, e paralelamente uma investigação de documentos em q esta unidade fabril é referida.
Soube que o motivo decorativo deste meu bule, decorado por estampa ou transfer-print num tom azulado, é suposto chamar-se papoilas, mas sem certezas por ainda não ter sido encontrado nenhum exemplar em que constasse, junto à marca, o nome do motivo. A data de fabrico, como a de todas as minhas peças, é certamente posterior a 1886, já que lá constam as iniciais da segunda sociedade a dirigir a fábrica: Lopes & Cª.
Mais um bule, sem tampa mas em muito bom estado, ostentando uma decoração com ramagens, flores e espigas. Marca igual à do bule anterior. Motivo espiga?
(Não, trata-se do motivo PRIMAVERA, segundo li bastante mais tarde no mesmo blogue sobre a faiança de Alcântara).
O prato raso que se segue é decorado com o motivo Egypcio, segundo informação do blogue referido.
Este motivo ou padrão decorativo teve origem, como muitos outros, na produção inglesa, tendo sido utilizado, também a castanho, pela Copeland, antiga Spode, em 1855. Chamaram ao padrão Honeysuckle ou Empire.
Também segundo o blogue acima referido, é o motivo PHANTASIA que decora o bule e a terrina que se seguem, respectivamente em castanho e em verde. Embora todos os motivos acima apresentados sigam as tendências artísticas da época, final do séc. XIX, é neste motivo que se percebe melhor a influência dos modelos ingleses que seguiam o Movimento Estético (Aesthetic Movement).
É um estilo muito ligado ao movimento Artes e Ofícios (Arts and Crafts), pode-se dizer uma primeira versão inglesa da corrente estética Art Nouveau, que surgiu como reacção ao gosto vitoriano, muito enfeudado a estéticas revivalistas do passado, tanto clássico como medieval.
É interessante verificar que a própria marca , quer do bule, quer da terrina PHANTASIA, tem escrito LOUÇA À INGLEZA e não FAIANÇA FINA como as restantes peças.
O prato abaixo, inglês como se vê na marca, foi fabricado entre 1868 e 1883 por Wedgwood & Cº (não confundir com Wedgwood Etruria de Josiah Wedgwood) e os elementos da decoração denominada BEATRICE - ramos, flores, fitas, arabescos à maneira oriental - são semelhantes aos das anteriores peças Alcântara.
É de notar, por curiosidade, que para além da marca de fabrico, este prato ostenta a Patent Office Registration Mark, uma marca em forma de losango presente nos produtos industriais ingleses entre 1842 e 1883, como já referi num post anterior. A cerâmica pertence à classe IV, que se vê a encimar o losango, e quanto aos números e letras em cada ângulo do losango, dão informação precisa sobre o dia, mês e ano de registo do produto. Neste caso o J corresponde a 1880.