Celebrando-se hoje o segundo aniversário do blogue Velharias, do LuísY, é a ele que dedico este post, com votos de que celebre muitos mais aniversários, para deleite de todos nós.
O prato foi oferta de uma querida amiga e minha madrinha (também minha comadre, já que dois filhos são meus afilhados, um deles padrinho da minha filha; é afilhada da minha mãe que por sua vez é afilhada da mãe dela... estão a ver o intrincado da relação... lol).
Sempre conheci os pratos Miragaia lá em casa, mas obviamente durante muitos anos não sabia do que se tratava. Este verão estive mais uma vez a apreciar um que está exposto, a ver a marca, Miragaia Porto por extenso, e a apreciar a pasta, lembrando-me das atribuições indevidas que se vêem pelas feiras. Ao falarmos dele a minha madrinha referiu que o par tinha sido partido por um dos meus afilhados em miúdo, tinha sido colado mas não sabia onde ele parava. Acrescentou que se calhar alguém já o tinha deitado fora...
Imaginem o meu desgosto! Disse-lhe que de qualquer forma, se o encontrasse, eu gostaria muito de ficar com ele mesmo partido e colado (que descaramento!)
Finalmente - alegria!!! - o prato apareceu e foi-me oferecido.
Tinha uma cola amarela e estava muito mal colado, com junções mal ajustadas, abertas mesmo. Tive que meter mãos à obra e comecei pela descolagem.
Esqueci-me de tirar uma fotografia do estado em que estava antes, mas tirei esta depois de descolado.
Segui as dicas que me foram dadas por um vendedor, meu ex-colega, para a descolagem e limpeza e comprei uma cola recomendada pela conservadora e restauradora Sandra Pena. No fim o meu marido encheu as ranhuras com uma massa branca e eu dei-lhe uns retoques a azul.
Não se pode dizer que tenha ficado um trabalho perfeito, mas para mim é um encanto poder apreciá-lo, exposto no meu armário de faianças.
No catálogo da exposição "Fábrica de Louça de Miragaia" editado pelo Museu Soares dos Reis em 2008, há um prato igual e com a mesma marca na página 221.
No mesmo catálogo este motivo decorativo conhecido por "tipo país" utilizado no 2º período de fabrico (1822-1850), fase em que se pretendia imitar a faiança inglesa azul e branca, é associado a um exemplar da Herculaneum Pottery de Liverpool com um motivo central conhecido como "View in the Fort Madura" da Indian Series.
Tenho um prato desses há anos mas não conhecia a relação entre os dois motivos e mesmo depois de já ter visto a exposição sobre a Fábrica de Miragaia, mas antes de comprar o catálogo, fui alertada para o facto num post do blogue do LuísY.
O prato que tenho há mais tempo é o da direita, em flow blue ou azul escorrido, mas o da esquerda que adquiri entretanto, deve ser mais antigo, quer por ainda se ver em baixo a chamada seam ou costura da junção da estampa na aba, problema que foi resolvido pela técnica do flow blue, quer pela tonalidade da pasta e rebordo no tardoz.
No meu fraco entendimento de pastas cerâmicas, acredito que o mais antigo seja em creamware e o outro em pearlware, até porque tem uma tonalidade azulada, caraterística da pasta desse tipo de fórmula.
As marcas também são diferentes, situar-se-ão entre 1810 e 1820, mais ou menos o período em que foi usado este padrão decorativo, tendo a fábrica sido encerrada em 1840.
O que é curioso é que o nosso motivo “País” da Fábrica de Miragaia e de outras que a imitaram, sobretudo Darque na opinião de José Queirós,está mais próximo da versão da Herculaneum do que esta está da pintura original de Thomas Daniell, do final do século XVIII . Até as flores em fundo esponjado da aba, usadas por Miragaia e que depois perduraram como cercadura muito típica nas faianças do Norte, devem ser uma cópia da aba de flores da versão Herculaneum. Nesta, a cena resultou de uma amálgama feita pelos artistas gravadores de elementos presentes em várias gravuras de uma série de paisagens indianas - juntaram ao forte um arco, a vegetação luxuriante, incluindo as palmeiras, uma montanha e as figuras e assim criaram uma paisagem que nunca existiu. A Fábrica de Miragaia só não copiou a montanha e as figuras de homens e elefante, mas também há peças mais pequenas desta série da Herculaneum que não incluem estes elementos.