Despertava-me curiosidade encontrar ali aquele edifício, de consideráveis dimensões e ar sóbrio e imponente, tão diferente das habituais capelinhas de aldeia, à beira de uma estrada secundária, numa localidade pequeníssima.
Acabei por parar para explorar o local e aí descobri uma pequena construção a albergar uma fonte, esta encimada por inscrição em Latim que a data de 1676. Pensei então que a capela seria da mesma época, o que não consegui confirmar na altura.
Vim a saber mais tarde que a capela tinha sido alvo de um assalto, já há duas ou três décadas, e espoliada das suas imagens mais antigas, entre elas a da sua patrona, Nossa Senhora das Neves.
Ficou assim mais pobre e sempre fechada, à exceção dos dias de festa em honra da sua padroeira, no início de Agosto.
Ex-voto datado de 1782 a agradecer uma cura a Nossa Senhora das Neves |
No mês de Agosto passado houve um motivo adicional para a festa: a conclusão das obras de restauro do interior da capela, particularmente do retábulo da capela-mor e outras beneficiações no interior e na cobertura do edifício.
Tal aconteceu graças a um avultado donativo de uma senhora que foi durante muitos anos residente em Anadia e que, dizendo-se devota e afilhada de Nossa Senhora das Neves, quis assim homenageá-la, devolvendo alguma dignidade a esta casa.
Este retábulo, que o Pe. A. Nogueira Gonçalves, meu velho professor da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, no seu Inventário Artístico de Portugal, Distrito de Aveiro, Zona Sul, Lisboa, 1959, data da primeira metade do século XIX, foi agora todo restaurado por técnicas de Conservação e Restauro com acompanhamento do IGESPAR.
Foi na companhia da atrás referida senhora, a principal benemérita da obra a quem me liga uma familiar e amiga comum, que consegui finalmente visitar o interior da capela e ainda uma pequena jóia que ela esconde nas traseiras: a primitiva ermida, de forma circular, construção do século XVI segundo A. Nogueira Gonçalves, que acabou por ficar ligada à atual capela e lhe servir de sacristia.
O interior da ermida é revestido do chão à cúpula por azulejos polícromos do século XVII, do tipo conhecido por pinha, alcachofra ou maçaroca, e de fabrico lisbonense, segundo o citado autor .
Aqui pode ver-se o resultado do vandalismo e da ganância, que certamente estragou mais do que aproveitou aos criminosos, quando o edifício esteve votado ao abandono e pouco vigiado.
Será agora a vez desta ermida ou sacristia beneficiar de obras, estas bastante onerosas dado o estado em que se encontra a estrutura e sobretudo a cúpula, mas parece que já há luz verde do IGESPAR para a sua realização. O problema é que falta o mais importante...
Oxalá que, à falta de dinheiros públicos, possamos continuar a contar com pessoas com esta generosidade, que prescindindo de bens próprios, se dispõem a ajudar a recuperar e a enriquecer o património de todos nós.