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Cantharellus Lutescens no meio das folhas secas |
O Outono, para além das temperaturas amenas do início da estação e da beleza das paisagens salpicadas de tons de ouro e de fogo, mesmo nas zonas urbanas, tem para mim um encanto muito especial: é a época por excelência dos cogumelos silvestres.
Já
aqui escrevi sobre este meu gosto, há precisamente um ano e um mês, e referi os cuidados que fui tendo ao longo de anos, antes de me aventurar a consumi-los.
Um desses cuidados foi rodear-me de livros da especialidade, procurando conhecer bem as caraterísticas de cada espécie e só colher os exemplares a que conseguia, pelas suas caraterísticas, atribuir o nome científico.
Mas para além de livros, nos primeiros anos de autodidatismo, fui reunindo recortes de jornais e revistas, fotocópias, imagens, folhetos e guias de apanha, tudo o que me pudesse esclarecer sobre este mundo tão vasto e tão interessante, mas também tão perigoso para incautos.
Assim, já nos tempos de plena confiança, tenho apanhado e consumido o Coprinus Comatus, o Agaricus Campestris, o Macrolepiota Procera, o Lepista Nuda, o Lactarius Deliciosus, o Boletus Edulis, o Cantharellus Lutescens, o Agrocybe Aegirita, o Tricholoma Terreum, o Hydnum Repandum, o Pleurotus Ostreatus (o último que identifiquei no campo e consumi pela primeira vez)...
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O Coprinus Comatus que nunca chega a abrir o chapéu |
Claro que para a maioria das pessoas estes nomes não significam nada, mas pretendo dar uma ideia da variedade de espécies que se podem encontrar aqui na Bairrada e nem sequer mencionei o Tricholoma Equestris, o míscaro amarelo dos pinhais de areia, a espécie mais conhecida e apreciada por aqui, mas que eu não faço questão de procurar, pois parece estar sob suspeita em alguns países. Não causando intoxicações agudas, suspeita-se de que pode ter efeitos nocivos no organismo por acumulação de anos de consumo. Mesmo assim, graças à oferta de um amigo que é um habitué na apanha desta espécie, e como cá em casa somos todos apreciadores, temo-nos deliciado com um prato de míscaros todos os anos (uma vez por ano não deve fazer mal) :)
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Agaricus Campestris, o parente mais próximo do Champignon de Paris |
Este ano andei um pouco desolada, já que o Setembro e o Outubro, muito secos, não deixaram que os micélios (as ramificações subterrâneas destes macrofungos) dispusessem da humidade suficiente para dar "frutos" à superfície - os tão apreciados cogumelos.
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Lepista Nuda, popularmente conhecido por Pé Azul |
Finalmente o mês de Novembro mostrou-se mais generoso e eis que começaram a brotar estes botõezinhos que depois desenvolvem um pé e abrem num belo chapéu, maiores ou menores conforme a espécie.
Agora que estamos a chegar ao fim da estação e temos tido dias chuvosos ainda vão aparecendo por aqui várias espécies enquanto as temperaturas não baixarem muito, sobretudo à noite.
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Um cogumelo ainda muito jovem |
O primeiro livro que comprei sobre cogumelos foi "Cogumelos Silvestres" de Natalina de Azevedo, onde encontrei não só a descrição detalhada das espécies mais comuns em Portugal, mais de 50, quer comestíveis, quer tóxicas, incluindo as mortais, mas também instruções para a cultura de cogumelos em determinados substratos, formas de conservação e ainda muitas receitas regionais.
Como precisava de um livro que me desse a conhecer outras espécies, comprei mais tarde este guia espanhol, "Guia de Hongos", que encontrei na FNAC. Trata de cerca de 400 espécies de fungos e tem boas fotografias a ilustrá-lo. Graças a ele fiquei a conhecer muito vocabulário espanhol sobre este tema e também os vários tipos de intoxicações e respetivos sintomas.
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Curiosamente, estes dois primeiros livros apresentam como ilustração de capa o Amanita Caesarea, um cogumelo comestível, e parece que um ótimo comestível, pertencente à temível família dos Amanitas onde estão incluídos os mais tóxicos e mortais como o Amanita Phalloides ou o Amanita Virosa. Nunca o encontrei, parece que é colhido no Alentejo e também em Trás-os-Montes com o nome de abesó, mas se o visse também não o consumiria, porque para alguém pouco habituado à sua apanha, poderia trazer à mistura o bonito, mas tóxico e alucinogéneo, Amanita Muscaria (o cogumelo mágico vermelho com pintas brancas das histórias dos anõezinhos), já que este perde os farrapos brancos, restos do véu, se apanha muita chuva.
Este, "The Ultimate Mushroom Book", foi o terceiro livro que tive e é o meu preferido. Na capa vêem-se dentro de um cesto de verga, o recipiente ideal para apanhar cogumelos, várias espécies, todas elas referidas na minha listagem em cima.
Foi-me oferecido pela minha filha como prenda de aniversário há já uns anos. É um livro grande, tipo álbum, com fotografias belíssimas e descreve várias espécies não só do grupo das comestíveis, mas também das venenosas. São dele as fotografias de cogumelos que aqui apresento porque a verdade é que quando vou colhê-los, esqueço-me sempre de levar a máquina e além disso a qualidade das fotografias não seria a mesma. Claro que, sendo uma edição inglesa, se centra sobretudo nas espécies mais populares no Reino Unido, mas a maioria é-nos comum.
Na segunda parte inclui muitas receitas, cujas ilustrações só por si fazem crescer água na boca.
Este último foi-me oferecido pelo autor, o Dr Xavier Martins, médico hospitalar no Porto mas natural do concelho de Mogadouro e grande entusiasta dos cogumelos. Esteve durante vários anos à frente da Associação Micológica "A Pantorra", da qual já fui associada, com sede em Mogadouro, bem assessorado pela sua mulher, a bióloga galega Marisa de Castro, especializada em Micologia.
Neste livro, antes da descrição em pormenor das 40 espécies mais comuns em Trás-os-Montes, há vários capítulos muito úteis, não só sobre a conservação e o consumo, incluindo receitas tradicionais transmontanas, mas também sobre o uso medicinal dos cogumelos e o tipo de intoxicações, efeitos nocivos e tratamento. Um capítulo muito interessante é o de etnomicologia transmontana em que aparecem provérbios e romances com os nomes populares de várias espécies.
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Um Amanita Muscaria, colhido este ano perto de casa, mas só para vista... |
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Amanita Phalloides, o maior responsável pelas intoxicações mortais resultantes de falência hepática |