quinta-feira, 27 de novembro de 2014

O Museu do Açude e a Fábrica de Santo António, Porto

Fotografia retirada da internet

Na minha recente passagem pelo Rio de Janeiro, no final da visita que fiz à minha família "brasileira" estabelecida num estado do Sul, desafiei-os para irmos todos até ao Museu do Açude na Floresta da Tijuca.
Tive conhecimento da existência deste museu através do blogue Azulejos antigos no Rio de Janeiro, do Fábio Carvalho. Tinha lá visto inúmeras fotos por ele publicadas em vários postes sobre o museu, e fiquei cheia de vontade de ir pessoalmente ao local logo que tivesse oportunidade.


Alpendre onde se expõem cerca de duas dezenas de ornamentos cerâmicos de origem portuguesa.
Só a ida até lá já foi uma bela experiência que agradou a todos, dada a localização daquele complexo de edifícios numa extensa propriedade bem cuidada, envolvida pela vegetação luxuriante da Mata da Tijuca. Pertenceu a um magnata e colecionador de arte brasileiro de nome Castro Maya e é hoje um dos Museus Castro Maya, a par do Museu da Chácara do Céu, situado em Santa Teresa, que também visitámos. Cada um deles alberga coleções de arte reunidas por Raymundo Ottoni de Castro Maya (1894-1968), distinguido-se o Museu do Açude pelas coleções de cerâmica, desde a azulejaria de várias épocas e origens até à porcelana chinesa, à faiança inglesa e aos ornamentos arquitetónicos de origem portuguesa provenientes do Porto e Gaia.


Foram objetos como este, de fabrico português - que pudemos apreciar tanto em espaços interiores, como no exterior dos edifícios que formam o Museu - que me despertaram o interesse em fazer a visita. Mas também lá pude ver beirais com telhões de faiança e belíssimos painéis de azulejos, como estes neo-clássicos que são complementados por dois globos em faiança com a marca de Santo António, Porto, ou seja, a nossa velha conhecida fábrica gaiense de Santo António de Vale da Piedade.


Apesar da beleza dos azulejos e da profusão de painéis, coleção que o Fábio Carvalho tem devidamente documentada no seu poste, interessou-me sobretudo fotografar os artefactos cerâmicos de ornamentação arquitetónica - vasos, globos, leões, figuras alegóricas - que, ao contrário dos azulejos, tinham a sua origem portuguesa bem identificada, na sua grande maioria com o nome de Santo António Porto.










Mas também Miragaia, Devezas (de José Pereira Valente) e Cavaquinho ali estão representadas.




E também os fabulosos telhões de faiança, tanto em exposição...



 


... como aplicados nos beirais.

Duas decorações muito comuns em telhas de beiral azul

Decoração em policromia com motivo de pássaros e estrelas
Verifiquei que dos vários leões em faiança que se encontravam espalhados pelo exterior, em pé, sentados ou deitados, havia exemplares marcados Santo António e outros com marca Miragaia. Já sabemos como as duas fábricas estiveram próximas, não só na localização - uma de cada lado do rio Douro - mas também na gestão e na produção, sobretudo durante uma década (1824-1833) em que estiveram nas mesmas mãos, a família Rocha Soares. Mais tarde, após o fecho da Fábrica de Miragaia, em 1850, acredita-se que foi Santo António de Vale da Piedade que herdou os moldes e muita da mão de obra dali proveniente. (1)







Daí que não nos deva surpreender encontrarmos quer uma quer outra marca nos simpáticos leõezinhos brancos dos jardins do Açude, assim como em vasos ornamentais expostos no alpendre.
E depois havia leões amarelos, com um ar muito patusco, que não cheguei a ver se estavam também marcados... e agora tenho pena.


Finalmente, à entrada do outro museu, a Chácara do Céu, deparámos logo com dois magníficos cães de faiança a ladear o portão de entrada.
E...adivinhem...




















Estão também marcados Santo António Porto!

Sendo por muitos conhecido como o Brasil foi o principal destinatário das cerâmicas portuenses de uso arquitetónico, ao longo de todo o século XIX, a participação nesse processo da Fábrica de Santo António de Vale da Piedade penso que fica aqui devidamente ilustrada, graças a este acervo tão especial do Museu do Açude.

O que resta da Fábrica de Santo António de Vale da Piedade em Vila Nova de Gaia
(fotografia de ruinarte)

(1) Catálogo da exposição Fábrica de Louça de Miragaia, Museu Nacional de Soares dos Reis