sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

O Cantão Açoriano



Há cerca de um ano, quando andei a investigar a origem do prato com a coroa do Espírito Santo que aqui publiquei, tive em casa vários livros de um autor terceirense, Francisco Ernesto de Oliveira Martins, colecionador de arte e investigador, infelizmente falecido em Novembro último.



Estes livros, de uma amiga também terceirense de Angra do Heroismo, que vive perto de mim, vieram-se juntar a um que havia cá em casa do mesmo autor, Arquitectura nos Açores, muitíssimo bem ilustrado e que eu já tinha andado a folhear de novo.


Neste encontrei placas cerâmicas fabricadas na Ilha Terceira no final do séc. XIX, marcas de posse  aplicadas em fachadas de casas particulares, onde facilmente reconhecemos motivos florais da nossa faiança da mesma época.




Mas confesso que o que me encheu mais os olhos foi o Louça inglesa nos Açores, que folheei inúmeras vezes para apreciar cada um dos belíssimos exemplares de faiança inglesa quase toda azul e branca da coleção do autor. 



E eis que, após várias páginas de faiança inglesa, me deparei  com dois exemplares de faiança de S. Miguel, referenciada como cantão açoriano, que julgo provenientes de olaria da Lagoa. Sem qualquer explicação para a inclusão ali destes exemplares, depreende-se que o autor lhe reconhecia origem nos motivos de loiça inglesa, como sabemos por sua vez inspirados em motivos vindos de bastante mais longe... da porcelana chinesa. 


Na cercadura do prato vemos afinidades com as cercaduras de Miragaia e afins, mas no desenho central, embora com as nuvens e palmeiras da faiança dessa zona, temos uma casa do tipo alpino, como em algumas peças de Coimbra e de Alcobaça ou ainda de Vilar de Mouros, que também conhecemos do motivo Roselle da faiança inglesa e de outros como o Avon Cottage.
Na caneca, num rosa forte bem popular, temos o pagode a representar os motivos orientais do Willow e uma grande flor, quem sabe uma peónia a ladeá-lo.
Interrogo-me sobre quais os elementos comuns às duas peças que as fizessem ser englobadas na categoria de Cantão, neste caso Açoriano, e só consigo detetar a decoração monocromática e a presença de edifícios exóticos, como também exóticos pretendem ser os elementos vegetais aqui representados. Será que foi esse o critério para a classificação?
E o chamado Cantão de Coimbra? Será a faiança produzida na região com motivos semelhantes aos destas peças açorianas, como as terrinas que mostrei num post já antigo?





9 comentários:

  1. Happy New Year Dear Maria... .. I am not sure what the criteria for the classification is ...perhaps the complete decor and pure essence scenery endears this pottery... I'm particularly fond of the Avon Cottage pieces.... What a wonderful library of books you have to access for this study...I always find your post most informative and inspiring... Wishing you a healthy and happy New Year 2013...Hugs

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    1. Hello Zaa,
      I loved your comment as it shows you understood the text – with Google Translator one never knows - and appreciated this antique rustic earthenware made in the Azores.
      Portuguese antique earthenware, most of it unmarked, makes us keep posing questions of difficult answer… and that’s very challenging!
      Thanks for your visit and I wish 2013 is the best new year ever to you. Hugs

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  2. Uma ótima postagem essa! E como eu não entendo nada do assunto, gosto muito de aprender um pouco, e ver as belas fotos.
    b'jinhos!

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    1. Está a ser modesto, amigo Fábio, bom conhecedor de cerâmica como é... Em relação a esta faiança mais popular, todos andamos às apalpadelas, por isso acho importante partilharmos o que vamos encontrando...
      Beijos e obrigada pela simpatia.

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  3. Que a louça inglesa que ficou nos Açores seja fantástica, será seguro, pois a quantidade de famílias inglesas que ali se estabeleceram ao longo do século XIX foi significativa e, claro, terão deixado a sua marca com as importações que fariam ou então com o que elas próprias deveriam trazer.
    Agora, ver as peças denominadas de Cantão dos Açores e outras afins, é algo de encantador e até curioso.
    Claro que ali estão as influências da cerâmica do continente, mescladas com as inglesas, e até quiçá com outras que nos escapam, no entanto a forma como foram interpretadas é algo de belo e singular.
    Até as cores das peças apresentadas são distintas das que se produziam por cá, como se a diferente luminosidade da região a isso levasse (estas últimas palavras não têm qualquer fundamentação cientificamente provada, a não ser a do facto, conhecido, de como a luminosidade de algumas regiões influenciou e afetou o cromatismo da pintura aí produzida).
    Enfim, fico a sonhar com peças destas e como a sua beleza está tão associada ao espírito explorador e aleatório do génio português ao interpretar os desenhos das cerâmicas que lhes chegavam do estrangeiro.
    Manel

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    1. Tem razão, Manel, neste livrinho "Louça Inglesa nos Açores", o autor atribui a presença ali de grande quantidade desta loiça ao comércio da laranja com a Inglaterra, iniciado no século XVIII, com famílias inglesas residentes a dominá-lo. Segundo textos que o autor cita, os navios ingleses que vinham buscar a laranja, traziam de Inglaterra os porões carregados de tecidos, chá, mobiliário e loiças. Os exemplares que aparecem neste livro são todos da coleção do autor, coleção essa que foi doada ao Museu de Angra do Heroismo - instalado no Convento de S. Francisco que foi o meu antigo liceu... durante dois anos :).
      Embora haja nesta obra padrões de faiança inglesa que eu não conhecia, para mim a grande novidade foi ver estes exemplares de Cantão Açoriano.
      Ainda bem que também gostou de os ver.
      Um abraço

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  4. Bem, cheguei no fim e quase todas as deixas, que tinha em carteira, já foram usadas pelo Manel e pela Maria Andrade. GRRRR.

    De facto, no passado, em Londres comiam-se as laranjas de S. Miguel, que eram consideradas pelos ingleses as melhores de todas. Apesar de esse florescente comércio ter acabado há muito, ainda existem alguns campos dessas larangeiras na ilha de s. Miguel e são muito curiosos, pois estão rodeados de loureiros para proteger as larangeiras dos ventos e da canícula marítima. Ao longe, a quem os vê da estrada, parecem quintas de gente aristocrática vedadas por extensas sebes.

    Essas peças de cantão popular são um encanto e o Manel tem razão. As cores são diferentes das de cá. Talvez tenha a ver com a origem dos materiais. Há muitos anos, quando estive em Ponta Delgada com a minha ex-mulher fomos comprar barros a uma localidade vizinha, famosa pelas suas olarias e o barro era de um castanho muito escuro, num tom como nunca vi cá. Talvez a origem daquela cor estivesse nos materias vulcânicos que abundam naquelas ilhas.

    Em todo o caso, a Maria Andrade chamou a atenção e muito bem para mais um lado desconhecido da faiança portuguesa.

    bjos

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    1. Deixe lá, o Luís arranja sempre maneira de acrescentar aqui informação interessante e acaba por me dar outras deixas... ;)
      Embora se fale mais dos laranjais de S. Miguel,o que é natural pelo tamanho da ilha, o negócio também era florescente na ilha Terceira e atribui-se a construção do melhor bairro residencial dos arredores de Angra ao dinheiro ganho com esse comércio.
      Em relação aos laranjais micaelenses, eles eram efetivamente vedados para proteger as laranjeiras dos ventos marítimos, mas para além de loureiros ou de incensos, tinham no início do séc. XIX grossos e altos muros de pedra, o que, se protegia as árvores do vento, também as abafava e provocava doenças, havendo nessa época muitas perdas de frutos para a exportação que eram apesar de tudo aproveitados pelas populações locais - há autores que chegam a dizer que as crianças pareciam sofrer de icterícia...
      Quanto às peças de cantão açoriano, o facto de as cores serem diferentes deve ter que ver com a maior ou menor concentração dos óxidos na combinação que faziam para obter as cores. Mas é verdade que os barros das olarias micaelenses são efetivamente muito escuros, também lá comprei duas peças e sei do que fala e isso já deve ter relação com os solos vulcânicos.
      Bem, já chega de conversa! :)
      Beijos

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  5. boas .. nao conheço nada da materia mas gosto de apreciar loiças antigas tenho algumas peças que comprei por ca e por lá .. mas tenho uma que nao sei nada da origem dela .sera que a sra MARIA ANDRADE me dá uma ajuda ? roberto ferreira terceira

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