domingo, 26 de dezembro de 2010

Garrafa vassoura em faiança das Caldas

Garrafa vassoura
Vi-a no chão, no meio de outros objectos, na pequena feira de velharias da Curia e chamou-me logo a atenção, pelo formato e pelas dimensões.
Peguei nela e verifiquei q tinha uma marca no fundo, gravada na pasta, mas ilegível a olho nu. Perguntei à vendedora de que é que se tratava, mas ela não me soube dizer. Disse -me que a tinha comprado há poucos dias por também a ter achado uma peça interessante e nem tinha reparado que tinha marca.
Fez-me um preço muito razoável e eu trouxe-a para casa.
O fundo da garrafa sendo visível a marca oval
A peça parecia-me ter qualidade, quer pelo brilho do vidrado, quer pela modelagem naturalista, tão original.
Ao analisar melhor a marca, com a ajuda de uma lupa, e comparando-a com as marcas de fabricantes de faiança das Caldas - a hipótese que coloquei logo à partida - constantes do 2º volume da obra "Faiança Portuguesa" de Arthur de Sandão, verifiquei tratar-se da marca de António Alves Cunha, Caldas da Rainha.
A mesma marca encontrada num jarro à venda num site de leilões
António Alves Cunha (1856-1947) era filho de um outro ceramista caldense, José Alves Cunha, e dirigiu a sua oficina nas Caldas entre 1890 e 1925, tendo produzido uma variedade enorme de peças utilitárias e decorativas.
Investiguei ainda este formato de garrafa e descobri ter tido alguma popularidade nas Caldas da Rainha na viragem do séc. XIX para o XX,  já que encontrei outros exemplares em sites de leilões, em amarelo como esta, mas também  em verde, produzidas por outros fabricantes, nomeadamente Bello e Herculano Elias.
Era a época em que Raphael Bordallo Pinheiro, ao inspirar-se nos trabalhos do ceramista francês Bernard Palissy (1510-1590) criou formas vegetais e animais de uma qualidade surpreendente, reconhecida dentro e fora de portas. Nas colecções de artes decorativas dos museus ingleses, os que conheço melhor no estrangeiro, as formas de arte que nos representam são, para além dos painéis de azulejos do séc. XVIII, os azulejos e peças naturalistas de Raphel Bordallo Pinheiro.
Para os apreciadores da cerâmica das Caldas desta época, recomendo uma visita ao Aliança Underground Museum, nas Caves Aliança em Sangalhos, no coração da Bairrada, onde, entre outras colecções reunidas por Joe Berardo, se pode admirar um extenso e magnífico conjunto de peças Bordallo Pinheiro, estilo Palissy e outras.

11 comentários:

  1. É uma modelagem realmente muito curiosa!
    Os feixes da vassoura, quando olho a foto ampliada, parecem feitos de talharim! :-)
    Parabéns pelo achado.
    abraços
    Fábio

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  2. Sabe, Fábio, lembro-me de se usarem vassouras destas,feitas de feixes de junco, penso eu, com ou sem cabo. As que não tinham cabo, exatamente iguais a esta, usavam-se para varrer as lareiras, nas cozinhas rurais. Tudo isto antes da era do plástico, já se vê.
    Acho interessante esta peça de cerâmica ser uma reprodução tão fiel em forma e tamanho.
    Abraço

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  3. Realmente a sua peça é muito curiosa e muito característica de um certo estilo insólito das Caldas da Rainha.

    A maioria dos portugueses de classe média habitua-se a ver com maus olhos a louça das Caldas. Acham sempre aquilo tudo com um gosto duvidoso. Eu também fui assim educado e um belo dia fiquei muito surpreendido, quando numa loja onde eu trabalhei há 30 anos atrás (o meu primeiro emprego) entrou um senhor americano muito distinto, da Embaixada dos EUA em Lisboa, e comprou entusiasmado, às dúzias, taças de sopa em forma de abóbora e pratos em forma de couve, tudo das Caldas. Aquilo impressionou-me muito e creio que fui a primeira vez na vida, que percebi que o gosto em que fui educado era discutível.

    Há uns cinco anos atrás voltei a pensar neste assunto, quando visitei em Paris, o musée des Arts décoratifs. Depois de salas e salas com porcelanas de Paris, de Sêvres, cómodas Luís XIV, interiores completos com boiseries Luís XV e XVI e todos aqueles luxos franceses estonteantes de tanto dourado, encontro uma sala de jantar, montada como se fosse haver ali um banquete, repleta de peças da autoria de Palissy e seus seguidores, reproduzindo cabeças de porco, couves, repolhos, cenouras, cerejas, crustáceos e sei lá que mais. Olhando bem para ali percebi porquê é que o tal Senhor Americano tinha gostado tanto daquelas loiças das Caldas da loja da rua da Palma.

    De facto a louça das Caldas é aquilo que há de mais barato e mais próximo, que os coleccionadores amantes do estilo Palissy podem aceder como tal aparece em todos os livros de velharias anglo saxónicos e também franceses.

    Não colecciono Caldas, porque o dinheiro e o espaço não chegam para tudo, mas já olho para essa loiça com uns olhos bem mais tolerantes.

    Abraços

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  4. Caro Luís,
    Bem vindo de volta ao meu blogue. Já tinha saudades dos seus interessantes comentários.
    Eu também tive um percurso semelhante ao seu em direção à loiça das Caldas. Não era nada apreciadora daquelas formas de animais e de hortaliças, achava-as aparoladas e de mau gosto. Lembro-me até q quando me casei recebi algumas peças, por exemplo uma jarra feita de rabanetes, e eu não descansei enquanto não me desfiz daquilo.
    Muito mais tarde tomei conhecimento da arte cerâmica de Bordallo Pinheiro e ainda mais tarde da obra de Bernard Palissy e de como esse estilo tinha grande valor artístico e era apreciado, pelo menos no mundo anglófono. Também visitei o Museu de Artes Decorativas em Paris, vi peças de B.Palissy e, aos poucos, o gosto vai-se formando.
    Não posso dizer q seja a minha área preferida da arte cerâmica mas reconheço-lhe o valor, e o mérito dos seus criadores. Parece q quem introduziu cá o estilo Palissy foi Manuel Mafra e dele tenho uma pequena peça q hei-de aqui mostrar.
    Abraços

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  5. Boa noite

    Tenho igualmente uma peça com a mesma marca de fabricante na minha coleção. Trata-se de uma imagem de Santo António que pode visualizar aqui:
    http://muraldaspetas.blogspot.com/2012/01/made-incaldas-da-rainha.html
    Desconhecia os pormenores sobre o fabricante que aqui elucida...parabéns igualmente pela sua aquisição.
    Cump.
    El Mano del Tajo

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  6. Caro EMdT,
    Muito obrigada pela sua visita e comentário.
    Já fui ver o seu Sto António do António Alves Cunha, uma imagem muito bonita, e agora irei percorrer o seu blogue à medida que vá tendo tempo...
    Apareça sempre.
    Cumprimentos

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  7. ola onde eu consigo uma vassoura dessas ?

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    Respostas
    1. Boa tarde,
      tenho garrafa vassoura igual, mas feita e marcada pelo pai José Alves Cunha, ao invés do filho António Alves Cunha.
      José Alves Cunha, ceramista fundou uma fábrica de cerâmica em 1862, cujas peças foram apresentadas na Exposição Internacional de Paris (1867), na Exposição Internacional de Filadélfia (1876) e na Exposição Internacional de Paris (1900), nesta última tendo recebido uma Menção Honrosa.
      Vou pôr esta peça à venda no OLX e Custo Justo.
      Obrigado e saudações a todos

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  8. Tenho uma garrafa igual mas com atampa original

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  9. Tenho uma igual mas sem tampa o que é uma pena

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  10. Tenho uma garrafa do mesmo autor e com o mesmo carimbo no fundo que representa uma mulher a tocar um cavaquinho.

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