sábado, 14 de maio de 2011

Apontamentos Arte Nova na Curia - IV

Quando se visita a Curia, não se pode deixar de reparar neste belo edifício com um ar um pouco Art Nouveau, presentemente devoluto e à venda, que se situa na Avenida Central, a principal artéria da Curia, ao longo do Parque das Termas.

                           

O aspecto actual resulta de obras de recuperação a que foi sujeito há cerca de 15 anos, mas felizmente não lhe alteraram a traça. O nome Villa Rosa data dessa remodelação, já que antes disso era conhecido primeiro como Hotel Rosa e, a partir dos anos 30, tendo aumentado os níveis de exigência, como Pensão Rosa.



Como já aqui referi, numa mensagem anterior sobre a Curia, o grande surto de construções termais e hoteleiras nesta estância deu-se nos anos dez e vinte do século passado, daí podermos reconhecer em vários edifícios a influência da estética Arte Nova.


É o caso deste edifício, construido em 1914, que está mesmo classificado pelo Guia de Portugal da Editorial Presença como de estilo Arte Nova, segundo li num de vários artigos que Mª Cristina Simão publicou sobre a Curia, na revista cultural de Anadia  Aqua Nativa. Será certamente uma interpretação portuguesa das caraterísticas desse estilo.


Embora o nome do arquiteto não seja conhecido, notam-se aqui preocupações estéticas em todas as fachadas e uma volumetria muito atraente. Na fachada principal é de salientar a graça da escadaria, o pequeno terraço, o belo beiral a descer simetricamente pela fachada e o formato das janelas que ladeiam a entrada principal.


O torreão embeleza as fachadas sul e nascente, esta nas traseiras, mas visível quer da Linha do Norte, quer da Estrada Nacional 1.


Deve ter constituido um bom investimento para  o proprietário, o hoteleiro Manuel Joaquim Rosa, já que logo em 1915 ele encomendou um novo projeto a uma dupla de arquitetos de Lisboa. Era um projeto mais grandioso, um Grande Hotel, mas devido a entraves colocados pela Sociedade das Águas da Curia, na altura ainda a definir arruamentos e outras obras, a construção foi sendo sucessivamente adiada e nunca se veio a realizar.

A avaliar pelo número de pessoas que posaram para a fotografia neste postal - tal como os outros dois, da coleção Alberto Simões - o hotel tinha uma razoável afluência ainda antes dos anos 20. É interessante observar os vários tipos sociais, entre crianças e adultos, hóspedes, serviçais e outros populares. Para além dos hóspedes, certamente pertencentes a uma burguesia abastada, famílias inteiras que vinham a águas, vê-se uma criada de quarto à janela, criadas com avental a vir das traseiras, um rapaz de boné e bicicleta, talvez moço de recados ou mero transeunte. No primeiro plano está uma rapariga com um cântaro à cabeça, ainda uma forma de se assegurar naquela época o abastecimento de água ao hotel, pelo menos para beber e para confecionar alimentos, já que haveria certamente um poço ou um tanque com água trazida do rio Cértima para as restantes necessidades de água.


Afinal, só no fim da década de 30 este estabelecimento, que entretanto passara a designar-se Pensão Rosa, publicita a existência de água canalizada em todos os quartos. No entanto, a única casa de banho disponível para os 24 quartos (!!!) não dispunha de água quente. Segundo o gerente da altura, se necessário a água era aquecida na cozinha e transportada para os quartos, mas parece que isso raramente acontecia uma vez que a maioria dos clientes tomava banho no balneário termal... :)

6 comentários:

  1. Eu não me atreveria a classificar este edíficio como pertencente ao movimento "Arte Nova", apesar de haver quem o faça.
    Classificar tem este problema, é muito subjectivo.
    Tenderia em classificá-lo mais como pertencente a um estilo dito revivalista, dotado de alguns elementos decorativos Arte Nova. Este tipo de edifício é comum a tantos outros do final do XIX, início do XX.
    Há uma tentativa de recriar os edifícios do tipo "Chalet suiço" a que não falta uma escadaria de entrada e uma torre, ambas de inspiração italiana e vãos já com laivos "art deco".
    Decididamente, é um edifício muito bem adaptado à época e um prazer ver hoje, se bem que, e apesar de, talvez, classificado (não sei se o estará ou não), é um forte candidato ao abandono, pois é demasiado belo e grande, e, afinal, faltam-lhe as características que o tornariam um edifício rentável pelos padrões de hoje!
    No entanto, ainda me parece em boas condições e se alguém o quiser aproveitar, será esta altura para a sua aquisição.
    Hoje este tipo de edifício é considerado como "elefante branco", o que é uma pena!
    Em Inglaterra ou em França estas edificações são subdivididas e transformadas em modernos e confortáveis apartamentos de habitação, de que os donos muito se orgulham e os candidatos a ocupantes lutam entre si para ocupar!
    Aqui, espera-se que caia ou que arda, e resolve-se o problema.
    O lugar será logo ocupado por um "pálito" desengraçado e desadequado, herdeiro do funcionalismo, mas que enche o bolso de alguns!
    Se algum prurido existir tenta-se aproveitar algumas porções do edifício que se colocam à laia de "casca" de um outro, já meio aborto, dedicado ao terciário que, com o original, só tem em comum a lembrança.
    Raras vezes se aproveitam estas edificações de forma coerente através de uma transformação que lhe confira funções comunitárias que poderiam apoiar as populações.
    Quem tem o dinheiro e o poder prefere investir em coisas de raiz, deixando a nossa herança a apodrecer, ao lado, e não temos quaquer tradição dentro da filantropia, como existe nos Estados Unidos, por exemplo.
    Uma boa semana e obrigado por nos trazer estas pérolas da nossa herança construída, enquanto é possível admirá-la!
    Manel

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  2. cara Maria Andrade

    Aprecio muito estes seus passeios pela arquitectura termal da sua região. Desta vez enriqueceu o post com postais e fotografias antigas, tentando trazer-nos aquilo que foi a vida a burguesia, que ia a banhos.

    Concordo com o Manel quando afirma que é um pouco forçado designar o estilo desta casa como arte nova. Julgo que pertence a um estilo eclético, onde se mistura de tudo um pouco e que é muito comum nessa época, nos locais de veraneio ou nas zonas termais Em Portugal.

    A este propósito transcrevo um texto delicioso de Ramalho Ortigão, que afirmava que nos Estoris se podia ver “um aflitivo manicómio de prédios onde cada casa manifesta a sua especial mania: uma julga-se chinesa, outra suiça, outra gótica, outra normanda, esta supõe-se castelo feudal (...), esta imagina-se granja de Nuremberga”». Julgo que este texto se aplica na perfeição a este seu delicioso edifício da Curia, que é vagamente alemão, vagamente arte nova e vagamente um chalet suiço.

    Na altura do Ramalho esta arquitectura eclética era muito criticada, mas hoje parece-nos deliciosa e cheia de charme

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  3. Manel,
    Conhecendo edifícios construídos segundo a estética Arte Nova, tanto cá como no estrangeiro, também tendo a pensar que este não deve ser classificado como tal, embora se notem influências desse período num ou noutro elemento decorativo – o trabalho em estuque com as pontas enroladas junto ao beiral, por exemplo. Todo o ar dele remete para as modas arquitetónicas dessa época, daí talvez a razão da classificação.
    Realmente é uma dor de alma ver um edifício destes vazio, mas não acredito ou por outra, não quero acreditar que ele possa estar à mercê da lei do camartelo. Esse fim triste foi dado ao edifício vizinho que se vê no primeiro postal e foi um dos primeiros hotéis da Curia, aliás foi primeiro explorado pelo hoteleiro que veio a construir este. Não tinha a beleza arquitetónica do Villa Rosa mas era um marco na história da Curia e podia ter sido preservado. Começou por ser Hotel Rosa, depois Hotel da Curia e mais tarde Pensão Portugal.Veio abaixo há uns três anos, depois de décadas de abandono e agora está lá um prédio de apartamentos e lojas, todo modernaço. Pelo contrário um pouco mais à frente , um edifício da mesma época, Hotel Santos ou Pensão Santos, foi totalmente remodelado mantendo-lhe a traça original e é agora um belíssimo Hotel Sénior. Felizmente há estes bons exemplos para nos animarem…
    Um abraço

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  4. Olá Luís,
    Agora venho aqui só em escapadelas porque iniciei recentemente umas funções muito especiais :) e o tempo que sobra é pouco.
    Adorei a sua citação de Ramalho Ortigão, ele sempre tão crítico e atento a tudo o que se passava no país.
    Acabo por concordar consigo e com o Manel, este é
    um edifício com uma mistura de influências muito típica do ecletismo. Há um ou outro elemento que se reconhece como Arte Nova, mas está longe de ser um exemplar típico.
    Ainda na semana passada visitei em Salamanca o Museu Arte Nova e Arte Deco, esse sim, instalado num belíssimo edifício Arte Nova, a Casa Lis, cuja visita recomendo vivamente. Para além do edifício com muito vidro em vitrais, ferro e azulejos da época, alberga excelentes coleções de artes decorativas com representação de nomes de primeira categoria: Lalique, Gallé, Chiparus...
    Vim de papinho cheio!!!
    Um abraço

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  5. Um maravilhoso edificio, reconstruido por um empresario Luso Venezolano.

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    1. Sim, é verdade, um senhor de apelido Carloto, daqui originário, que emigrou para a Venezuela. Só é pena que um edifício tão belo agora esteja desativado...

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