terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Lustrina inglesa para o chá no bicentenário de Dickens - English lustreware for tea on Dickens's bicentenary

Charles Dickens(1812-1870)

Assinala-se no dia de hoje o bicentenário do nascimento de Charles Dickens, um dos escritores ingleses que li e reli durante a adolescência, de início incentivada pelo meu pai também seu grande admirador, tornando-se  um favorito a par de Jane Austen ou das irmãs Brontë.
Para mim e para muitos é o escritor  por excelência da Inglaterra vitoriana.


Escolhi por isso para o chá que vou partilhar com Tea Cup Tuesday e Tea Time Tuesday chávenas de lustrina inglesa rosa, um tipo de loiça que associo muito aos ambientes vitorianos da classe média.

C. Dickens em sessão pública de leitura de uma das suas obras
(Fotografia do acervo do Museu Victoria & Albert)

Afinal essa era a classe a que o próprio Dickens pertencia e que retratou na extensa galeria de personagens que dão vida aos seus romances, a par dos pobres e desprotegidos da fortuna que habitavam orfanatos e asilos e cujas condições de vida e de trabalho, na Inglaterra da Revolução Industrial, ele tratou de denunciar.


Curiosamente, esta chávena, de um modelo e decoração muito em voga na década de 20 do séc. XIX, apresenta uma cena pastoril, um estilo de vida em perfeito contraste com a realidade laboral da maioria da classe trabalhadora inglesa nessa época. Em vez de campos verdejantes com passarinhos a chilrear e doces ovelhinhas a pastar - trabalho de sol a sol, é certo - os ex-camponeses, homens, mulheres e crianças, viam-se agora encerrados em escuros edifícios fabris, trabalhando sem verem a luz natural, durante 14 ou 16 horas por dia, seis dias por semana - e só não trabalhavam ao domingo porque era o dia da missa, da doutrina, enfim, o "Dia do Senhor".


Este é o meu exemplar preferido por aqui se aliarem dois processos decorativos: a aplicação de lustrina rosa (ou púrpura) no bordo do pires e da chávena e a técnica de estampagem por transfer-print, na mesma tonalidade numa cena central, com uns retoques de pintura à mão.


Como é comum nas peças de lustrina, abundantemente fabricadas nas unidades fabris de Staffordshire e também em Leeds, durante todo o século XIX, não existe marca de fabrico, mas neste pires aparece o nº de padrão 155, um número bastante baixo que está de acordo com as décadas em que penso terá sido introduzido, a avaliar pela moda deste tipo de decoração com uma cena estampada.


Esta segunda chávena apresenta uma decoração mais vulgar, mas acho-a bonita, com alguma delicadeza na sua decoração floral, ao contrário de muitos outros  motivos com desenhos grandes e pesados.
A lustrina está bastante gasta, sinal de que as peças foram muito usadas, já que estes não eram serviços para guardar só para ocasiões festivas.


Note-se o pormenor da asa, um dos formatos muito usados em Inglaterra no século XIX.


Mais uma vez aqui só o número de padrão se encontra a marcar o pires, neste caso o nº 1134.

Trouxe para este chá comemorativo duas obras das mais conhecidas e divulgadas de Charles Dickens, também em filmes e em séries: Oliver Twist e David Copperfield.







São duas edições inglesas centenárias - uma data de 1911 e a outra de 1913 - a  que dedico especial estima, mas que abordarei com mais pormenor num outro post.
Esta edição do David Copperfield está primorosamente ilustrada a cores e não resisti a deixar aqui a Mrs Micawber rodeada dos seus pequenos rebentos na hora do chá.

MRS MICAWBER AND FAMILY

Nota: Voltando às chávenas, só uns meses depois de publicar este post me apercebi de que a chávena com a cena central pastoril foi decorada por bat print. E há que tempos eu desejava ter uma chávena e pires assim decorados! ;)  Só que fixava-me nas cenas neoclássicas a preto...
(ver  post do blogue Velharias sobre o assunto).

29 comentários:

  1. I love this era of teacups. And such a wonderful post in honour of Charles Dickens! Thanks for sharing and linking to Tuesday Cuppa Tea!
    Ruth

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  2. Beautiful tea cups and saucers. Interesting reading books. Pat

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    1. Hi Pat,
      Being the first time you're visiting me, I must tell you you're most welcome in my blog.
      Thanks for being my follower, too.

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  3. Your cups are perfect! Bella! Thank you so much for sharing them with us. Blessings, Martha

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  4. What a simply fabulous tribute to share with Mr. Dickens... a beautiful cup filled with tea... and a good read...AHHHHHHHHhhhhhh..How relaxing... Lovely post... Hugs

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  5. Dickens, Swift, Defoe e Scott acompanharam-me durante a juventude e, o primeiro, não me deixou até aos vintes! Li e reli, porque representava um mundo que me encantou, nos antípodas daquilo que conhecia, de tal forma que continuei, pela vida fora, a dar alguma preferência por este tipo de literatura, passando pela Eliot, para lá das manas Brontë e Austen (as mulheres deste período deram cartas neste campo) até ao excêntrico, e encantador, Oscar Wilde com as sua escrita rigorosa e sarcástica, cheia de ação, que ainda hoje me continua a fascinar (Dorian Gray continua a ser objeto do meu culto!).
    Mas o meu encanto maior deu-se com o indiano Thackeray e, posteriormente, pela associação ao mundo colonial inglês, que me fascinava, Kipling. Joyce também me marcou, mas por outras razões ...
    No entanto, não foi para falar de literatura que comento, mas para lhe dizer que a célebre cerâmica de reflexos dourados árabe deu frutos neste tipo de cerâmica.
    As muito célebres, e ambicionadas, cerâmicas de reflexos dourados da Espanha, entre as quais as de Manises sobressaem, por me parecerem as mais belas (entre nós existem belíssimos exemplares espalhados pelos nossos palácios e museus, entre os quais, o de Portalegre, exibe bons exemplares - lembro-me agora que, há bem pouco tempo, perdi-me em contemplação de peças deste tipo, no Palácio Nacional de Sintra), eram obtidas por métodos trabalhosos mediante três cozeduras e a adição de óxidos de cobre ou prata.
    Ao invés, apesar do ar de família com a aristocrática produção espanhola, esta cerâmica inglesa era de produção menos onerosa, e bem mais ao alcance da bolsa de uma média burguesia emergente.
    Tenho a sorte de possuir um prato, igualmente de produção inglesa, que, não sendo muito grande, possui a mais elegante e bonita decoração que conheço neste tipo de cerâmica. Contemplo-o amiúde, porque me fascina a forma como o pintor dominava o picel produzindo traços seguros e fluídos.
    Estas suas peças são bem caraterísticas desta fase, sendo a sua última chávena aquela pela qual me perderia, sem dúvida alguma!
    Manel

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    1. Para grande parte das pessoas da nossa geração, Manel, mais ano menos ano :), todos estes nomes devem ser familiares.
      Eu conheci-os primeiro nas edições Romano Torres, na coleção "Obras escolhidas de autores escolhidos", que eu procurava sempre nas bibliotecas fixas ou itinerantes e que tinha a sorte de também receber como prendas de aniversário.
      Não referi o Walter Scott como favorito, mas também me deliciei a ler e reler várias obras dele, sendo a minha preferida "A Donzela do Nevoeiro" ou "Anne of Geirstein". Do J. Swift e do D. Defoe só li uma obra de cada, claro as mais populares.
      Eram realmente mundos fantásticos que se nos desvendavam durante os períodos de férias, sobretudo nos 3 meses das férias grandes.
      Já o Thackeray, o Wilde e o Kipling só li mais tarde, numa altura em que os interesses e ocupações se diversificavam muito e estas leituras já não me deixaram uma impressão tão marcante, mas tenho edições inglesas já antigas muito interessantes de "Vanity Fair" e "The Virginians".
      Do James Joyce li contos, mas nunca consegui ler o "Ulisses". Houve outras leituras entretanto que valorizei mais, como John Steinbeck, por exemplo, ou D.H.Lawrence... para só falar de autores anglófonos.
      Enfim, mas quanto às cerâmicas com acabamento a lustrina, reconheço a mestria técnica e artística, mas para lhe ser franca não é uma área que me entusiasme muito; mesmo na lustrina inglesa, gosto da rosa, mas já a dourada e a prateada não acho tão atraentes. Também não podemos gostar de tudo, e ainda bem!!! :)
      Agora fiquei cheia de curiosidade em conhecer esse seu prato...
      Um abraço

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    2. Assim que for ao Alentejo fotografá-lo-ei e enviar-lho-ei por email.
      Este tipo de curiosidade é facilmente resolúvel :-)
      Manel

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    3. Muito obrigada, Manel, cá fico a aguardar.
      Esqueci-me de referir, na resposta ao seu comentário, que onde há uma boa coleção de cerâmicas hispano-árabes com reflexos metálicos, de Manises sobretudo, é na Casa-Museu Guerra Junqueiro, no Porto, não sei se conhece.
      Vale a pena a visita, também pela coleção de faiança portuguesa e outras coleções igualmente valiosas.

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  6. Beautiful antique cups! Such fine color after all these years too. The pattern is so pretty with those fluffy "flowers" around the edges, they remind me of thistle.
    Thanks so much for sharing these with us.
    Hugs,
    Terri

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  7. OH! WHat pretty cups~ I especially like the circular handle of the floral teacup. Nice to see another Dickens fan...I like him so much I named one of our cats after him! lol~
    Thanks for visiting my blog.

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  8. Me ha encantado tu post ,esa fusión entre literatura y té y esas preciosas tazas
    Un Beso

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  9. Hi Maria,
    What fabulous cups; the colours and history are wonderful! Nice to honour Dickens too as he is a favourite of so many of us. Thanks for sharing with us and have a lovely day.

    Blessings,
    Sandi

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  10. Olá!

    Faça-me um favor: envie-me um e-mail para ficar como seu contacto, istoporque não consgo ver o seu endereço. Obrigado.
    pn_cagareu@hotmail.com
    (Queria falar consigo).

    Pedro Marques, Aveiro.

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    1. Olá Pedro Marques,
      Já lhe tinha respondido, mas o comentário, não sei como, não foi publicado.
      Gostei que viesse aqui primeiro, embora sem comentar nada, porque privilegio os primeiros contactos através do blogue e por e-mail, um mero complemento ao blogue, raramente respondo a pessoas que nunca apareceram por aqui.
      O meu endereço de gmail está no perfil, mas já agora também lho deixo abaixo:
      andrade.maria 82@gmail.com

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  11. Hi Maria, what lovely cups and saucers. Thanks for the history lesson re Dickens. Very interesting. I have recently found your blog and am now following you, and will visit often. Please stop by my blog and perhaps you would like to follow me also. Have a wonderful day. Hugs, Chris
    http://chelencarter-retiredandlovingit.blogspot.com/

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    1. Hi Chris,
      Thanks for dropping by in my blog and for being my newest follower!
      You're very welcome here!
      "Retired and loving it" is a very good name for a blog! :) I do share that feeling with you!
      I'll certainly visit your blog and be your follower, too.
      Have a great weekend.
      Hugs

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  12. Bem, as suas seguidoras internacionais já disseram o essencial, foi muito feliz a associação entre a literatura, a história e as chávenas. Julgo até que muitas vezes as peças, as velharias só fazem sentido se forem enquadradas históricamente e a Maria Andrade conseguiu-o em 3 pinceladas. E de facto estas chávenas transportam-nos aquelas séries de época da BBC, que a RTP deixou praticamente de passar.

    Também tenho a Casa Museu Guerra Junqueiro incluída na longa lista de coisas essenciais que me faltam visitar. Julgo que está algures entre o Partenon e o Hermitage. Mesmo assim, será mais fácil dar um saltinho ao Porto,

    Abraços

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    1. Olá Luís,
      O Charles Dickens merecia bastante mais desenvolvimento, mas em dia do chá ;) não dava para muito mais. Tenho que fazer um novo post a ele dedicado.
      Por falar em séries da BBC, agora até ando a seguir duas (ao tempo que isso não acontecia!): à segunda-feira à noite na RTP2 dá "Românticos Desesperados" sobre os pintores ingleses Pré-Rafaelitas, não sei se já viu, e ao sábado comecei a ver "Downton Abbey" na Fox Life, uma espécie de "Upstairs,downstairs" com outras peripécias.
      Logo que possa não deixe de dar um salto ao Porto.
      Um abraço

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  13. Thank you my sweet friend Maria Andrade! You're never to late to come and visit me, it only makes me sooo happy, you're such a well known lovely lady I always learn so much from, like your purple teacups...stunning!When I was a kid I had books on Charles Dickens as my dad taught us how to love him. Thank you for dropping by again and please, you are very welcomed. Wishing you a very happy Valentine's and lots of love.
    FABBY

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  14. Maria Andrade

    Neste momento estou sem televisão, porque não instalei ainda o maldito DDT, aquele descofificador com nome de insecticida

    bjos

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    1. Esse foi mais um transtorno e uma despesa que arranjaram para todos nós...
      Não há nada hoje em dia que poupe o cidadão comum!
      Mas valha-nos o bom humor e eu não pude deixar de me rir com essa do inseticida ;)

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  15. Boa noite,
    Andando a pesquisar sobre porcelanas, "dei" com o seu blogue que muito me fascinou.Queira aceitar os meus parabéns pelo blogue que assina.
    Li nos seus comentários, que por norma não responde aos e-mails enviados para a sua conta.
    Mesmo assim, como tive dificuldade em saber em que "post" lhe poderia pedir ajuda para a minha preocupação e porque também se tornava necessário o envio de um anexo, optei por enviar-lhe a minha mensagem por a outra via (e-mail, .
    Agradecendo-lhe antecipadamente pelo tempo que vier a disponibilizar para o meu pedido, apresento os meus cumprimentos.
    Jorge Pereira

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    1. Caro Jorge Pereira,
      Em primeiro lugar, muito obrigada pelas palavras de apreço em relação ao meu blogue!
      Como deve calcular, não criei o blogue para depois estar a receber sugestões ou a responder a questões de desconhecidos por e-mail. Claro que os meus seguidores ou os comentadores que aqui escrevem deixam de ser desconhecidos para mim e foi para eles que criei o e-mail de complemento ao blogue, precisamente para envio de fotos ou informações mais pessoais.
      O "espaço de partilha de gostos e de troca de conhecimentos sobre vários temas..." a que me refiro no topo da página é este blogue e é aqui que espero receber contributos ou até responder a questões, se para isso me sentir habilitada.
      Na sequência dessa salutar e enriquecedora partilha virão os contactos por e-mail, se for caso disso.
      Espero desta vez ter esclarecido melhor a minha posição em relação ao e-mail.
      Vou agora responder ao que me enviou. Cumprimentos

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    2. Boa tarde.
      Obrigado pela sua amabilidade e disponibilidade.
      Em futuros contactos vou ter em atenção os seus conselhos.
      Sempre ao dispor.
      Jorge Pereira.

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  16. Boa noite.
    Tenho algumas peças cerâmicas que gostaria de partilhar.
    Algumas dessas peças, não sei qual é a sua proveniência. Será muito útil para mim ter a opinião de quem percebe mais disto do que eu.
    Contudo, gostaria de saber se é possível esta partilha e, se a resposta for positiva como poderei fazê-la.
    Cumprimentos.
    Jorge Pereira

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    1. Caro Jorge Pereira,
      A melhor maneira é enviar-me fotos para o e-mail e depois lhe direi se estou familiarizada com o tipo de peças e se sou capaz de as tratar aqui.
      Cumprimentos

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    2. Obrigado.
      Irei proceder conforme sua orientação.
      Cumprimentos.
      JP

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