domingo, 6 de outubro de 2013

Uma fachada bonita na Figueira da Foz

Como toda a gente, gosto de fotografar as coisas que esteticamente me atraem e as casas antigas, sobretudo se revestidas a azulejos, estão entre as minhas preferências. Só que depois ficam muitas vezes a aguardar no cartão da máquina, até virem para a ribalta aqui no blogue.
Esta casa, na Rua da Liberdade da Figueira da Foz,  pode passar despercebida a muitos passantes, sobretudo os belos efeitos decorativos do andar superior, mas é sem dúvida uma das mais bonitas do chamado Bairro Novo, originalmente denominado o Bairro Novo de Santa Catarina. 

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Já a fotografei várias vezes. Houve alturas em que grande parte da casa ficava escondida por trás da folhagem dos plátanos e não se conseguia ver a totalidade da fachada. Outras, ao fazer a visualização das fotografias reparava que um carro maior ou uma carrinha ficavam inesteticamente a tapar uma parte da casa. Os feíssimos cabos pretos de eletricidade é que, sempre presentes e imutáveis,  não há hipótese nenhuma de evitar...
Um outro aspeto que me desgosta é a adulteração do original  com a introdução de caixilharia de alumínio, muito crua, em portas e janelas. Sobretudo a porta principal ficou horrível! E fico a imaginar aquelas bandeiras no seu aspeto primitivo, embelezadas por caixilharias em arcos, como as da casa que a Maria Paula fotografou em Braga.



Acho lindo o efeito matizado destes azulejos verdes biselados, um tipo de revestimento que foi muito comum na Figueira da Foz, nesta e noutras cores, mas de vez em quando, como aconteceu no ano passado na marginal de Buarcos, lá tenho o desgosto de ver mais uma casa destas a ir ao chão...
Confio que no perímetro do Bairro Novo estes exemplares estejam mais protegidos, mas quando até o antigo Casino Mondego, depois Hotel Portugal, foi substituído por um edifício todo moderno bem no centro da zona de picadeiro...




A construção desta moradia deve ser contemporânea da edificação do bairro, com início nos finais do século XIX. 
Embora haja aqui elementos decorativos que me fazem pensar no estilo Arte Nova - as linhas fluidas e naturais dos motivos florais, as portas e janelas geminadas com cantarias em arco - e a própria assimetria da fachada, penso tratar-se aqui de um exemplar eclético, de um movimento que se abria a vários estilos e influências. De inspiração neoclássica parece-me o painel de azulejos com as grinaldas e também o medalhão com o putto a beber por uma taça, sendo certo que estas figurinhas também se encontram nas composições Arte Nova. Muito interessante a sobreposição dos ornamentos em volutas ao padrão de azulejos, já de si um belo efeito conseguido com a aplicação alternada de azulejos lisos e de padrão floral muito simples.


Já a platibanda do corpo principal, sobre o mimoso friso de azulejos emoldurados com grinaldas, me parece apontar para outras influências... 
Mas não vale a pena dar palpites sobre assuntos que não domino. Faltando-me o conhecimento, basta-me a fruição estética de uma construção com arte e bom gosto que, já que escapou ao período recente de bota-abaixo e construção "moderna" desenfreada, estando a precisar de alguma manutenção, espero que consiga sobreviver à "crise" e durar por muitos mais anos...

15 comentários:

  1. Que deslumbre de casa!! Mas as esquadrias de alumínio são um crime! Eu arriscaria que a casa é de inícios do séc XX, mas não entendo nada de como os períodos artísticos se deram em Portugal. Se fosse daqui, eu afirmaria com mais segurança que deveria ser de algo entre 1900 e 1910, mas aqui os movimentos chegavam com atraso.
    O azulejo chanfrado verde parece muito primo-irmão dos do tipo mais fino que encontro muito aqui no Rio de Janeiro, no formato e na tonalidade de verde.
    b'jinhos e até breve!
    Fábio

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    1. Fábio, é provável que tenha razão e que esta casa seja do início do séc. XX. Afinal as modas e tendências também chegaram cá sempre atrasadas em relação aos países europeus que as ditavam.
      A utilização destes azulejos biselados ou chanfrados também me parece apontar mais para o século XX, embora quanto mais tardios mais uniformes na cor.
      Boa viagem de regresso a terras lusas! Até breve!
      Beijos

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    2. Muitos parabéns, Fábio, pela sua peça bordaliana! Que maravilha!
      Ontem não consegui abrir o link no blogue do Luís, só hoje a vi e fiquei de boca aberta. :)
      Sem dúvida presta uma bela homenagem à criatividade de Bordalo Pinheiro... e à sua, obviamente!

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    3. obrigado, querida Maria Andrade!
      b'jinhos

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  2. Olá Maria

    Continua a deliciar-nos com as descobertas que vai fazendo.
    Realmente, o friso de azulejos com os meninos agradam sobremaneira.
    A conjugação com os azulejos verdes da parede, tão ao gosto do Norte, é bem conseguida. Há tempos encontrei uns semelhantes, em amarelo, numa casa do século XIX (tinha a data numa das varandas em ferro) em... Moncorvo. É, agora, uma casa de turismo de habitação.
    if

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    1. Estas casas antigas e bonitas enchem-nos o olhar, não é assim, IF?
      Muito obrigada pelas suas achegas. Tive dificuldade em datar estes azulejos porque não encontrei nenhuns deste tipo na coleção on line do Museu do Azulejo. Sei que se começaram a fabricar no séc. XIX, mas o grande boom foi já no século XX, daí a minha dúvida em relação a esta casa. De qualquer forma, penso que a podemos situar num espaço temporal entre 1890 e 1910.
      Um abraço

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  3. Maria Andrade

    Também tenho um fascínio muito grande pelas casas desta época, cujo estilo se caracteriza por reunirem em si muitos estilos. É o chamado ecletismo. Ia-se buscar um bocadinho à renascença, outro bocadinho à arte nova, ao gótico e ao barroco e criaram-se estas moradias e prédios cheios de charme, que nos seduzem, mesmo que não os saibamos classificar. Também é por essa razão, que os arquitectos modernistas / funcionalistas odeiam estas casas.

    Do lado direito, situar-se-iam estar os salões principais da casa, que deveriam ser muito bonitos, provavelmente com estuques nos tectos.

    Realmente a caixilharia é um crime. E hoje há já caixilharia em alumínio lacado de muito boa qualidade. Os fios elétricos que estragam esta casa são mais uma prova de como a EDP é uma empresa sem responsabilidade cultural. Só pensa em roubar o cliente, todos os meses mais um bocadinho.

    Bjos e obrigados pelas imagens

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    1. Luís, efetivamente esta casa é um bom exemplo do que foi a fusão de estilos adotada pelo movimento eclético. Geralmente misturavam vários “neos”, e agora para nós é difícil precisar bem as influências, mas lá que o resultado é muito agradável à vista - pelo menos para nós os “vitorianos” : ) - lá isso é!!!
      E depois temos alguns atentados a estragar o efeito, como os EDPianos de que já temos falado. Apresentam lucros fabulosos, mas quando se trata de prestar bons serviços ou de contribuir para uma sociedade que têm explorado em regime de monopólio, é vê-los a fugir com o rabo à seringa...
      Mas ainda bem que gostou da casa. Beijos

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  4. Como diria o diácono Remédios, "Não havia nexexidade!" de colocar alumínio tão horrível nos vãos.
    Julgo que esta casa poderá ter sido construída, tal como apontam aqui, por volta de finais do XIX inícios do XX, se bem que me inclino mais para este último período.
    Este tipo de construção está, na minha cabeça, indelevelmente ligada a uma certa forma de arquitetura de lazer, que vejo aparecer nos locais de veraneio de uma certa camada social abastada e mais burguesa.
    Todos estes "ismos" que aparecem em conjunto, numa tendência eclética; a azulejaria que denota uma influência mais contida inglesa, por um lado, e a decorada com uma imaginária, interpretação barroca/romântica, que se vê bastante nos finais de oitocentos.
    A fachada é muito bonita, não fora o alumínio horrendo que invadiu a construção.
    Não sei como interpretar a dicotomia que aparece no topo desta fachada, pois de um lado a cimalha apresenta elementos de influência grega neoclássica, e, no corpo direito, a estética da decoração rebuscada é aposta sobre uma estrutura mais próxima das formas art-déco; mas, no entanto, os elementos decorativos já o não são. É uma confusão que não sei deslindar.
    Apetece-me, sempre que vejo uma fachada destas, agarrar nela e dar-lhe uma forma mais pura, extraindo-lhe os elementos que "fazem barulho".
    Muito obrigado por nos trazer estas fachadas que fazem o nosso panorama arquitetónico, e que o tornam mais interessante.
    Manel

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    1. Pois não, Manel, não havia! Sabemos como a madeira é perecível nestas zonas de ar marítimo, mas como o Luís refere, já há alumínios com um bom acabamento que não entrariam tão em choque com os outros elementos da fachada.
      Confesso que tive medo de meter o pé na argola ao falar desta casa, não me sinto à vontade nesta área, mas afinal confirma-me que não é fácil interpretar este tipo de fachadas, tal é a variedade de influências.
      Não admira que esta arquitetura esteja relacionada com as zonas de lazer, porque afinal coincide no tempo com o grande desenvolvimento das zonas de veraneio, termais e balneares, daí a necessidade de se construir muito e de preferência seguindo as modas da época.
      Quanto ao “barulho”, neste caso sou um pouco surda... nada me parece dissonante... lol
      Obrigada por todas as achegas que aqui deixou, mais uma vez acrescentando valor ao texto que alinhavei.
      Um abraço

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  5. Olá Maria Andrade
    Tem razão, para além alumínios das janelas, a porta principal está horrível e denota uma total falta de sensibilidade e estética. Estes edifícios deveriam estar classificados e regulamentadas as obras que aí se pretendessem fazer. Acredito até, que os proprietários são os menos responsáveis por situações destas. Por estes motivos e outros é que muitas das nossas terras vão perdendo muito do seu encanto e charme.
    Também me enfureço quando vejo, o que a degradação destes belos exemplares de uma época deixa adivinhar.
    Mas apaziguemos o espírito desfrutando da beleza que ainda resta nesta casa. A irregularidade do verde dos azulejos é linda e o concheado das volutas que contrasta com a singeleza e variedade dos azulejos da fachada, transformam esta casa numa joia que merece ser protegida.
    Beijinhos

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    1. Olá, Maria Paula
      Vamos assim partilhando as casas bonitas que nos estão próximas e que consideramos um regalo para os olhos e dignas de ser preservadas.
      Ainda sobre os alumínios, realmente o que me parece pior é a porta. A original seria de madeira maciça, talvez com vidraças protegidas por ferros forjados nas duas folhas, o que dava logo um outro aspeto à fachada.
      Mas regozigemo-nos com a preservação do restante que ainda é muito e bom...
      Beijos e bom fim de semana.

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  6. A casa foi construída pelo meu trisavô luso-brasileiro, ou melhor português naturalizado, coronel da guarda nacional ( coronel da borracha do Amazonas), que veio para Portugal por volta de 1912 e mandou construir esta casa para a filha Emília, minha bisavó, que veio também de Manaus com o marido que era português por volta de 1916. Viviam em Lisboa e esta casa da Figueira era a casa de ferias da nossa família. Eu ainda passei ferias ali em miúda. Depois da morte do meu bisavô a casa foi ‘estupidamente’ vendida ,o ultimo ano em que fomos para lá deve ter sido 1964 . Como é evidente as horriveis portas e janelas nao foram da autoria da nossa familia, foi o comprador que ainda fez mais um atentado, retirou o lindo vitral da janela da sala de jantar.

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  7. Ja agora volto para acrescentar que o trisavô brasileiro naturalizado se chamava Luiz da Silva Gomes, e que curiosamente foi também dono do palácio Schultz em Manaus.
    O palácio conhecido agora como Rio Negro foi hipotecado por Schultz ao meu trisavô em 1911 ou 12 ( sou má em datas) quando começou a crise da borracha. Ele ficou com o palácio que em 1918 vendeu ao governo para ser palácio do governador.
    Talvez toda esta relação com o Brasil explique o estilo da casa.
    Acrescento ainda que a venda desta casa ainda hoje custa muito a alguns membros da família. Ê o que acontece em famílias grandes, ganham uns perdem outros.
    Ainda hoje sempre que vamos à Figueira vamos em romaria à av. da Liberdade

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