Ando a rever a Gabriela... a cravo e canela, claro, só que em versão novela da noite! Nada de Dancing Days, Avenida Brasil ou outra que ainda há ou houve depois dessa, mas de que não sei o nome, apesar de a SIC tentar garantir as audiências para a sua sessão contínua de telenovelas, metendo umas nas outras, prolongando ou encurtando os tempos a seu belo prazer, sem qualquer respeito pelo espectador.
Por causa destes malabarismos, entre outras coisas, já há anos que não seguia nenhuma, mas a Gabriela conquistou-me de novo.
E na Gabriela, para além da titular e de outras figuras inesquecíveis saídas da pena de Jorge Amado (1912 - 2001) cujo centenário se celebra este ano, há uma personagem por quem nutro especial simpatia: a D. Sinhazinha.
Para já acho que chamar a alguém D. Sinhazinha, dois títulos em que um é nome próprio, não lembraria a ninguém, mas lembra à criatividade linguística dos nossos amigos e parceiros na lusofonia do lado de lá do Atlântico.
Pois é, simpatizo com a D. Sinhazinha e acho que estando casada com aquele brutamontes que às vezes lhe diz: "Quero lhe usar", só podia encontrar refúgio num santinho de aspeto jovem e bem parecido como o São Sebastião, a quem nem as setas todas a trespassá-lo alteram a beleza e compostura!
Acabou por encontrar um S. Sebastião de carne e osso e a história lá vai tendo os seus momentos tórridos, quase todas as noites, connosco a assistir...
Por isso, lembrei-me de partilhar aqui este registo de S. Sebastião, em homenagem à D. Sinhazinha agora que já se anuncia a tragédia - o seu querido S. Sebastião de barro já foi todo escaqueirado pelo odioso marido (fabuloso desempenho de José Wilker... mas que saudades dele jovem no papel de Dr Mundinho!) e as beatas de Ilhéus já se puseram em campo, com as antenas no ar. Vai acabar por ter em ficção o destino de muitas mulheres na vida real... ainda nos dias de hoje!!!
Mas voltando à imagem, este é o mesmo tipo de representação da estatueta de barro da novela, em que o santo não revela qualquer sinal de sofrimento e se apresenta como um verdadeiro Adónis, oferecendo-se assim à devoção de mulheres carentes como a D. Sinhazinha. A gravura não deve ser muito antiga, mas é bela e eu acho engraçado que a senhora que fez o trabalho manual com tecido, fitas e cordões - arranquei-lhe alguns extras pois era mais garrido e kitsch do que agora se apresenta - resolveu desenhar uma aura prateada à volta da cabeça. Realmente, por muito desajustado que seja o acrescento, sem ele a figura dificilmente lhe lembraria um santo!
Já esta segunda gravura, ao contrário do que é habitual, apresenta um S. Sebastião Mártir em sofrimento, aparentemente já moribundo. No canto inferior esquerdo podem ver-se os instrumentos do martírio e em pano de fundo uma cidade. Apesar de muito mais antiga do que a anterior - a mim parece-me trabalho do século XVIII - é uma representação bem mais realista de um homem martirizado pelas setas dos soldados de Diocleciano, o Imperador romano que o condenou à morte quando descobriu que ele, um soldado romano, era cristão.
Comprei-a há tempos na Feira da Ladra, atraída pela gravura, mas não deixo de achar interessante o tipo de moldura, um trabalho recente nada comum, com marca de um atelier (atelier P.T.).
Andei a pesquisar imagens do santo na internet e encontrei variadíssimas representações, mas sempre com a mesma iconografia de um homem semi-nu atado a uma árvore com o corpo trespassado por setas e quase sempre um corpo belo e jovem sem sinais de dor.
A única exceção que encontrei foi esta gravura magnífica da Biblioteca Nacional, datada de 1650-1750 sem certeza, em que vemos S. Sebastião de cabeça descaída e olhos fechados como aparece na minha gravura, mas com uma iconografia que inclui um anjinho a aliviá-lo do sofrimento retirando-lhe as setas do corpo. Parece um deus grego caído em desgraça!
Por que será que o anjinho também me faz lembrar Cupido a atingir o belo jovem com uma seta?
Já se adivinha aqui o caminho que há-de tomar a devoção a S. Sebastião...
Por isso, lembrei-me de partilhar aqui este registo de S. Sebastião, em homenagem à D. Sinhazinha agora que já se anuncia a tragédia - o seu querido S. Sebastião de barro já foi todo escaqueirado pelo odioso marido (fabuloso desempenho de José Wilker... mas que saudades dele jovem no papel de Dr Mundinho!) e as beatas de Ilhéus já se puseram em campo, com as antenas no ar. Vai acabar por ter em ficção o destino de muitas mulheres na vida real... ainda nos dias de hoje!!!
Mas voltando à imagem, este é o mesmo tipo de representação da estatueta de barro da novela, em que o santo não revela qualquer sinal de sofrimento e se apresenta como um verdadeiro Adónis, oferecendo-se assim à devoção de mulheres carentes como a D. Sinhazinha. A gravura não deve ser muito antiga, mas é bela e eu acho engraçado que a senhora que fez o trabalho manual com tecido, fitas e cordões - arranquei-lhe alguns extras pois era mais garrido e kitsch do que agora se apresenta - resolveu desenhar uma aura prateada à volta da cabeça. Realmente, por muito desajustado que seja o acrescento, sem ele a figura dificilmente lhe lembraria um santo!
Andei a pesquisar imagens do santo na internet e encontrei variadíssimas representações, mas sempre com a mesma iconografia de um homem semi-nu atado a uma árvore com o corpo trespassado por setas e quase sempre um corpo belo e jovem sem sinais de dor.
A única exceção que encontrei foi esta gravura magnífica da Biblioteca Nacional, datada de 1650-1750 sem certeza, em que vemos S. Sebastião de cabeça descaída e olhos fechados como aparece na minha gravura, mas com uma iconografia que inclui um anjinho a aliviá-lo do sofrimento retirando-lhe as setas do corpo. Parece um deus grego caído em desgraça!
Por que será que o anjinho também me faz lembrar Cupido a atingir o belo jovem com uma seta?
Já se adivinha aqui o caminho que há-de tomar a devoção a S. Sebastião...
Também por aí andamos, Maria Andrade, também por aí andamos...
ResponderEliminarNão pela telenovela, mas pela iconografia cristã: http://blogdaruaonze.blogs.sapo.pt/95564.html.
E Buarcos não podia faltar: http://blogdaruaonze.blogs.sapo.pt/tag/buarcos...
Saudações!
Obrigada, MAFLS, pelos links.
EliminarOs seus blogues da rua nove e da rua onze são autênticas enciclopédias de imagens com verbetes mais ou menos sucintos, mas sempre esclarecedores.
Tenho que os visitar mais demoradamente.
Cumprimentos
Também gosto de ver a Gabriela e sou de opinião que a Maitê Proença está a fazer o melhor papel da sua vida nesta interpretação da Dona Sinhazinha. Os portugueses tem ainda que aprender muito para fazer boas novelas. Aquele Dancing Days é um lixo.
ResponderEliminarSe pensarmos num santo nu, com um corpo de homem atlético, vendendo saúde, numa época, em que a moral é muito rígida para as mulheres, percebemos de imediato o sucesso desta devoção. Por outro lado, o corpo desejável do santo, que se oferece às flechas que o trespassam é facilmente associável ao prazer homossexual. Enfim, todas estas características fazem de S. Sebastião uma iconografia popular capaz de sobreviver nos nossos dias de liberdade sexual, ao contrário da pobre Santa Brígida. Lol
Gostei sobretudo da segunda estampa, que a olho nu, também me parece do século XVIII. Encantei-me com o detalhe da cidade avistada lá ao fundo.
Julgo que a relação com a gravura da Biblioteca Nacional é muito possível. E esta por sua vez deve ser cópia de alguma pintura italiana ou francesa. Como sabe nos séculos XVII ou XVIII vivia-se uma época em que a cópia era bem vista na arte. Um bom pintor, escultor ou gravador deveria copiar os grandes mestres e as obras da antiguidade.
bjos
Já sentia a falta do seu comentário sobre estas gravuras. Confesso que o Luís já me pegou um pouco o vício, tal como aconteceu ao Manel. :)
EliminarDeve ter reparado que nas duas gravuras antigas, a minha e a da Biblioteca Nacional, há pormenores comuns para além da postura do santo: a forma como a faixa de pano está arranjada em volta dos quadris deste homem e o arco, flechas e respetivo estojo, no canto inferior esquerdo. Houve certamente uma obra original comum às duas gravuras, como o Luís sugere.
Pode ser que eu um dia descubra essa obra...
Bom fim de semana, que já está mesmo aí à porta.