quinta-feira, 21 de julho de 2011

Terrina de faiança com várias leituras

Tenho algumas peças de faiança portuguesa, incluindo terrinas, para além das que já aqui partilhei, mas como não sou capaz de dizer grande coisa sobre elas, não me tenho sentido motivada a mostrá-las aqui no blogue.
A que mostro hoje é a última que comprei, juntamente com dois galheteiros também de faiança, numa daquelas ocasiões, raras, felizmente para a bolsa, em que não conseguimos escolher qual das peças comprar e trazemos o lote para casa. Este não foi caro porque as peças têm todas restauro ou pequenos defeitos.


Achei esta terrina muito curiosa  porque embora aparentemente a tampa e a base não coincidam, a verdade é que a pasta e as duas tonalidades de azul da decoração são exatamente as mesmas.

Vista de cima nota-se também a coincidência nos motivos geométricos que decoram as asas e a pega da tampa. Se as duas peças não nasceram uma para a outra, pelo menos fizeram-lhes um casamento feliz.


O motivo da base parece-me ser uma mistura do "País" de Miragaia e afins com uma versão de "Cantão Popular" mas não sou capaz de dar palpites quanto à origem. A cúpula do edifício e a palmeira lembram Miragaia e suas imitações, mas os restantes elementos já são de outro "filme".



É difícil perceber se a estrutura com arcos à frente do edifício pretende representar uma ponte, geralmente presente no cantão popular. Eu penso que sim, mas, podia também ser uma galeria no rés-do-chão do palácio com um terraço por cima...


Por baixo das asas, pequenos motivos de água e nuvens, muito presentes nas decorações cantão popular. A toda a volta da base o motivo dos edifícios aparece em repetição, quatro vezes.
Curiosamente todo o conjunto fez-me lembrar, salvaguardando as óbvias diferenças e distâncias, as terrinas redondas no "Cantão" chinês que têm na base uma cena original "Cantão" ou semelhante e a tampa só decorada com peónias.


Terrina do último leilão da leiloeira Renascimento, porcelana da China, período Qianlong

13 comentários:

  1. Ola Maria

    Muito bonita a sua terrina!!

    Parabens pela compra!

    Já tinha visto uma parecida com essa, em vermelho, mas com traços mais finos, motivo semelhante formato igual. A tampa tbm era diferente dessa...já foi no inicio quando comecei a fazer colecção.. Pediram 250euros..
    o.o claro que era para mim impossivel.
    Adorei Maria! O azul é soberbo! O motivo da terrina está muito bem executado!

    É pena que eu tambem não possa dar informações, mas espere pelos comentarios do Sr. Manel ou Luis, que eles diram qualquer coisa, de certo =)

    Não está marcada pois não?

    Caso para dizer que a sua tampa e terrina, viveram felizes para sempre!

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  2. Olá Maria Andrade, que bela aquisição.Parabéns.
    Gosto de terrinas em redondo.
    Analisando a peça julgo que a tampa não pertence à terrina apesar de casar bem com ela.
    O conjunto seguramente pertence ao último quartel do século XIX.
    A tampa quase sem dúvidas a atribuiria a faiança de Coimbra: cruzamento de traços em reservas da pega,esponjado decorativo grande,e filetes circulares em azul claro caraterísticos desta faiança.
    Quanto à terrina,decoração de cantão popular, para mim não se trata de Miragaia, erradamente este motivo 99% é atribuído a esta fábrica. Para mim será Coimbra:formato redondo;tipo de asa apesar de ser em redondo, a extensão da mesma já era uso no século XVIII em entrançado; pela extensão da ponte?; pelas portas e janelas; cúpula do pagode com pináculos nas pontas; formato caído das ramagens dos salgueiros e por último do filete largo em azul junto ao pé.
    O modelo de porcelana chinesa do reinado Quialong foi seguramente o mote de inspiração desta sua peça, aos olhos de um simples pintor deslumbrado no terreiro da Erva a olhar o Mondego.
    Beijos
    Isabel

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  3. Neste tipo de decoração tenho a teoria, que não passa disso mesmo, que deveria haver um determinado número de elementos que, no seu conjunto, constituiam o padrão como um todo.
    No entanto, e no intuito de fazer adaptar o padrão à forma, alguns dos elementos ou eram transformados ou desapareciam pura e simplesmente.
    O elemento simbólico que representaria as núvens, parece-me provir das mais vetustas "três contas", a interpretação das "cabeças de Ruyi", que aliás já apresentou antes neste seu blog, e de forma muito clara e completa como é seu hábito :) - encanta-me a clareza com que a Maria Andrade e o Luís descodificam aquilo que noutras obras, supostamente da especialidade, aparece envolvido e enleado num misto de liguagem arrevezada e descrições algo supérfluas do que todos podem ver logo na primeira abordagem fotográfica! Não admira pois que muita gente não tenha a paciência necessária para ir mais fundo no assunto.
    Continuando, a ponte aparece com diversas interpretações - normalmente provida de arcaria - e, já tenho visto, sem qualquer alusão à água que supostamente lhe devia estar subjacente. Sobre esta ponte, na versão original, estariam os três personagens principais da história, cada um deles identificado com o seu atributo, mas nas versões portuguesas é frequente desaparecerem, o que faz com que o motivo se torne meramente decorativo, desaparecendo o conteúdo da história que era afinal o ponto de partida para a decoração.
    A edificação, assim como a vegetação que lhe serve de enquadramento, aparecem com um misto de motivos ocidentais mesclados de orientais - construção, muitas vezes ocidental, mas coberta com cúpula orientalizante, e as árvores parecem ser salgueiros, ou ainda outras de identificação mais difícil, mas parecendo pertencer a uma flora ocidental, à mistura com palmeiras.
    Esta adaptabilidade dos diversos elementos é espantosa e dá lugar a interpretações tão belas quanto esta, a da sua terrina.
    O casamento das duas peças é muito feliz, os azuis não se diferenciam e a decoração da superfície da tampa parece estar na tradição do "horror vacui" que dominou a decoração da nossa faiança mais antiga.
    Este seu conjunto é deveras interessante e atraente
    Manel

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  4. Olá Flávio,
    Obrigada pelo seu comentário.
    É verdade que agora se compram faianças mais baratas do que há uns anos, mas é claro que o preço também depende muito do estado de conservação das peças.
    Não está marcada, como a maioria das faianças deste tipo, caso contrário teria aqui mostrado a marca.
    Ainda bem que gostou da peça.
    Aprecio o facto de ainda tão novo já ter este interesse por velharias e como frequenta muito as feiras, está sempre a tempo de vir a encontrar exemplares interessantes,como aliás já tem alguns.
    Apareça sempre.

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  5. Olá M.Isabel,
    Fico satisfeita por ter apreciado a minha terrina.
    Para mim é claro que não se trata aqui de uma peça de Miragaia, nem a comprei como tal,apenas lhe reconheço elementos do motivo "País" de Miragaia, as tais imitações que proliferaram tanto nas nossas faianças. Quanto a ser de Coimbra, também não tenho assim tanta certeza, mas é uma possibilidade...
    Acho-a muito genuína, muito autêntica, com aqueles desenhos grandes a preencherem todo o bojo e apesar da decoração profusa, não deixa de ser sóbria, com os dois bonitos tons de azul.
    É mais uma das nossas intrigantes faianças que tanto prazer nos dá apreciar...
    Beijos

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  6. Olá Manel,
    Penso que tem toda a razão na sua teoria: os artesãos disporiam dos motivos soltos em estampilha ou stencil e depois compunham a decoração mediante a forma do objeto e lá lhe acrescentavam mais uns pormenores à mão livre, como é o caso das núvens.
    Também estou de acordo quanto à origem dessas núvens, porque as cabeças de Ruyi eram igualmente usadas na decoração da porcelana chinesa a representar núvens e até lhes chamam por vezes "núvens Ruyi".
    Este é um mundo de histórias e de descobertas constantes, por isso se torna tão aliciante...
    Toda a sua interpretação faz muito sentido, quer em relação à ponte, quer em relação aos outros elementos, como as árvores e as figuras humanas, que aqui também aparecem, embora não em cima da ponte.
    Muito obrigada pelas suas palavras de apreço e por partilhar aqui as suas interessantes reflexões.
    Um abraço

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  7. É linda a sua terrina cara Maria Andrade, que bela peça para a sua coleção e, para não variar, de muito bom gosto. Gostei muito.
    Tentei enviar-lhe uma msg atravez do seu perfil, não sei se chegou à sua caixa postal...gostaria de lhe fazer chegar as fotos de um prato Derby que tenho aqui em casa e que prometi postar à uns bons tempos mas que não se prevê para breve.

    Um abraço


    Marília Marques

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  8. A faiança portuguesa do século XIX é realmente um mistério. Nada está marcado, as fábricas copiam-se umas às outras, cada artista interpretava à sua maneira o motivo da moda, ainda que dentro da mesma fábrica e o resultado é uma tremenda confusão, que só não é desesperante, porque as peças são realmente bonitas na sua ingenuidade e porque estes azuis evocam sempre e sempre a azulejaria das casas e conventos portugueses.

    Também concordo que a fonte de inspiração é a série país de Miragaia, bem como o padrão do Salgueiro, só que aqui foram interpretadas por um artista imaginativo. Aliás nunca tinha visto nada assim. Mais, todos os dias me surpreendo com a quantidade de variantes destes motivos existentes na faiança nacional.

    abraços

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  9. Olá Marília,
    Dá-me muito gosto vê-la aqui de novo.
    Encantam-me estas faianças, como me encantam as porcelanas, e Derby é uma delas, sobretudo a das fases mais antigas.
    Não recebi qualquer contacto seu, mas gostava imenso de ver esse seu prato Derby.
    Experimente usar este endereço de e-mail: andrade.maria82@gmail.com
    Abraços

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  10. Olá Luís,
    Estamos sempre de acordo quanto à dificuldade de identificar e de datar esta nossa faiança não marcada. Mas encontram-se realmente peças surpreendentes e é isso que vai alimentando a nossa paixão por estes objetos...
    A associação que faz aos azuis dos azulejos nem sempre me ocorre, mas faz todo o sentido.
    É o nosso património cerâmico no seu melhor...
    Muito obrigada pelo seu comentário, sempre enriquecedor.
    Um abraço

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  11. Hola Maria!
    Muito bella a sua terrina!! Me encanta el azul y blanco, es realmente preciosa Maria, vos tienes tantas lindas cosas. Gracias por tu linda y cariñosa visita, me he demorado en contestar a todas, pues estuve un poco ocupada con mis nietas en casa. Besos. FABBY

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  12. Ola Maria

    Obrigado pela amabilidade.

    Por vezes fico triste de ver peças e não as poder comprar, sabendo que são bons especimes, mas depois penso... Espera.... Só tenho 17 anos...
    E penso que são pouco os coleccionadores que começaram as 14... Tenho tempo... A minha ambição é tornar-me como vós... O Luis, o Manel, as Maria Andrade e Isabel... vocês são os meu modelos...

    "Eu dia quando for grande" quero ser como vos! Não vos substituir! Mas igualar. Gosto de aprender com os mais velhos... E ainda bem que existem...

    Um enorme abraços a todos

    Flávio Teixeira

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  13. Onde se lê
    "Eu dia.."

    Deve-se ler,

    Um dia

    Flávio

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